Ao se fazer um balanço do primeiro ano do conturbado governo Bolsonaro, poucas iniciativas de mérito se destacam. Mas não se pode deixar de ressaltar que um fato importante foi a sua decisão de entregar, a uma equipe técnica, a gestão do Ministério da Infraestrutura, que é responsável pela administração dos sistemas portuário e aeroportuário, além das políticas de trânsito e transportes (aéreo, ferroviário, rodoviário e aquaviário).
Como se sabe, em governos anteriores, o único critério que permeava a indicação para os principais postos na administração portuária, por exemplo, era o político, o que deu margem a muitos escândalos que expunham a concessão de benefícios públicos em troca de recursos privados para fins pessoais ou eleitorais. Sem contar a descontinuidade administrativa, aliada à falta de capacidade técnica, que impedia a administração portuária de colocar em prática um planejamento de longo prazo.
É claro que não se pode garantir que aquela prática nefasta ficou definitivamente para trás, mas o que se percebe é que há, na administração dos portos, uma nova orientação, marcada por uma face antiburocrática e descentralizadora, que procura oferecer maior segurança jurídica e regulatória, o que começa a devolver à iniciativa privada a confiança perdida. Diante disso, já começam a surgir aqueles investidores privados dispostos a acreditar nos projetos do governo federal para os portos públicos.
Entre esses projetos, estão a desestatização da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), cujo projeto já consta do Programa de Parcerias e Investimentos (PPI) da Presidência da República, e o programa BR do Mar, que pretende alterar o sistema de fretamento de embarcações e impulsionar a navegação por cabotagem, o que levaria o Porto de Santos a se tornar um hub port, ou seja, um porto concentrador de cargas.
Para tanto, porém, seria necessário que o governo investisse num projeto que previsse para o Porto de Santos uma plataforma offshore (plataforma avançada no mar) que pudesse receber cargueiros de última geração, ou seja, aqueles que suportam mais de 15 mil TEUs (twenty-foot equivalent unit ou unidade equivalente a um contêiner de 20 pés), o que, provavelmente, exigiria a participação de investidores estrangeiros, devido aos altos custos da obra. Mas parece que essa hipótese está descartada, pois o que se percebe é apenas a intenção de se continuar a gastar cada vez mais recursos nos serviços de dragagem, que, aliás, estão suspensos desde abril.
Como se sabe, a pouca profundidade e a grande quantidade de curvas do canal de navegação do porto santista não só têm impedido a escala de grandes cargueiros, como vêm dificultando a operação de navios destinados às operações de granéis líquidos químicos.
Por isso, não se entende como o Plano Mestre do Complexo Portuário de Santos, estudo disponibilizado pelo Ministério da Infraestrutura ao início de 2019, tenha estimado que o cais santista crescerá 110% até 2060, movimentando cerca de 280 milhões de toneladas por ano, sem que seja resolvido um problema tão crucial, como o da pouca profundidade do canal de navegação, pois hoje não têm sido poucos os navios desviados para o Porto de Paranaguá, em razão da impossibilidade de Santos oferecer calado e berços em condições satisfatórias.
Portanto, se hoje, numa época em que são baixos os níveis de crescimento da economia, já existem tantos problemas causados pelo assoreamento do estuário e dos berços de atracação, não é difícil imaginar o que poderá acontecer quando o País começar a crescer de forma vertiginosa, o que exigirá a entrada não só de insumos para produtos manufaturados como de líquidos para as indústrias químicas.