Matheus Miller: Considerações sobre recintos alfandegados

Nesta edição da coluna, o advogado especializado em Direito Portuário e Relações Governamentais fala sobre a necessidade de formalizar novos acordos de reconhecimento mútuo

Por: Matheus Miller  -  11/07/19  -  00:05

De zona primária ou secundária, os recintos alfandegados são espaços autorizados pela Receita Federal do Brasil para estacionamento ou trânsito de veículos, embarque, desembarque ou trânsito de viajantes; movimentação, armazenagem e submissão a despacho aduaneiro de mercadorias, bens de viajantes e remessas postais – todos procedentes do exterior, ou a ele destinados, inclusive sob regime aduaneiro especial.


Enquanto as mercadorias encontram-se sob o controle aduaneiro, elas devem ser depositadas em recintos alfandegados, públicos ou privados, para que fiquem à disposição dos agentes que realizarão sua admissão em território nacional.


O Regulamento Aduaneiro tem como objetivo assegurar a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior. Os recintos alfandegados, por sua vez, são ambientes sujeitos a rigorosos controles, onde ocorrem as fiscalizações de ordem aduaneira, fitos sanitária, sanitária e ambiental das mercadorias, tanto quando localizados na zona primária (como portos e aeroportos), quanto na zona secundária (como portos secos e CLIAS).


O Artigo 237 da Constituição Federal não faz distinção entre os recintos alfandegados localizados na zona primária e os localizados na zona secundária: todos realizam as mesmas atividades e prestam serviços públicos de interesse nacional.


Enquanto a infraestrutura alfandegada brasileira segue se aperfeiçoando, consequência dos investimentos privados realizados nos últimos quarenta anos em áreas do comércio exterior, a análise administrativa dos atos de comércio internacional, reservada à administração pública, passa por profunda transformação normativa e promete retirar do Brasil a pecha de país burocrático e atrasado na dinâmica do comércio global.


Nesse sentido, um dos pilares fundamentais do sistema de despacho aduaneiro brasileiro,  o instituto da “presença de carga”, deixou de ser preponderante para o processo de controle aduaneiro. Os novos instrumentos criados pela SRFB, como o Programa Brasileiro de Operador Econômico Autorizado (OEA) e o Portal Único de Comércio Exterior (Siscomex), são alicerçados na confiança recíproca, transparência da atividade comercial e análise prévia de risco - conceitos que chegam a permitir a admissão da mercadoria importada sem sua presença física em um local alfandegado.


Por força dos entendimentos internacionais e interesses globais expressados no acordo de facilitação do comércio exterior, do qual somos signatários, passamos a replicar um modelo adotado em economias desenvolvidas, que possuem sistema tributário simples, processos aduaneiros fundamentados nas premissas de boa-fé,transparência empresarial e tolerância zero com a impunidade, em que o resultado do comércio exterior é majoritário na formaçãodo PIB.


Projetados para tornar os processos de fronteira mais eficientes, o Canadá, os Estados Unidos e o México, por exemplo, trabalham com programas semelhantes ao OEA, que facilitam o comércio entre os países norte-americanos. São os conhecidos Partners in Protection (PIP), Customs-Trade Partnership Against Terrorism (CTPAT) e Authorized Economic Operator (AEO), respectivamente.


Pautados pelos princípios de otimização de tempo, segurança e eficiência, os membros destes programas assumem responsabilidades delineadas pelas associações para aumentar a integridade dos seus processos de produção e transporte; em troca, as empresas que cumprem com os requisitos passam a ser reconhecidas como comerciantes confiáveis e são pré-aprovadas no processo de fiscalização de mercadorias.


Por  aqui, o programa OEA, destinado a promover as exportações brasileiras nessas economias avançadas e desburocratizadas, está servindo fundamentalmente aos importadores para agilizar o controle aduaneiro e a fiscalização de suas mercadorias. A ausência da formalização de novos acordos de reconhecimento mútuo dificulta o ingresso do nosso produto “tipo exportação” nos grandes mercados internacionais.


O futuro dessas ferramentas de logística alfandegada, dotadas de modernas tecnologias de fiscalização, principalmente para a facilitação da movimentação de contêineres, poderá ser cada vez mais caracterizado por esse novo contexto do controle aduaneiro brasileiro. A ideia seria aproveitar o momento para expandir o portfólio dos seus serviços com foco na execução dos regimes aduaneiros especiais, de forma a incrementar o processo produtivo do setor industrial e contribuir para o crescimento da economia.


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