Frederico Bussinger: Regulação, governança e compliance portuárias

Nesta edição da coluna, o consultor, engenheiro e economista fala sobre a compliance precisa ir além de normas e probidade

Por: Frederico Bussinger  -  26/04/19  -  21:11

“O essencial é invisível aos olhos”
(“O pequeno príncipe” – Saint-Exupéry, aviador francês – passagens pelo litoral paulista)


Certamente os verbetes constavam dos dicionários. Também já deviam circular entre acadêmicos e iniciados. Mas nas “pedras pisadas do cais” habitual não era; o que nem serviu de álibi para inações, nem impediu as reformas portuária, rodoviária e ferroviária dos anos 90. Aliás, tais importantes inflexões, hoje reconhecidas, ocorreram todas sem a Lei das PPPs (2004). E até à margem do PND e sem a Lei de Concessões (95), foram feitas 5 concessões rodoviárias federais (únicas até 2008) e deflagrada a reforma portuária.


Análises mais profundas desses processos podem contribuir para formular, de forma sistêmica e sustentável, reformas por que tanto esperam nossas (travadas) infraestruturas... Em substituição a ações pontuais, voluntariosas e geralmente casuísticas que se tornaram rotina no passado recente.


Segurança jurídica é, hoje, presença quase obrigatória em pleitos, discursos e programas. Até parece que ela é tanto remédio; como sua falta a causa para todos nossos males. Mas por que não segurança regulatória? Segurança da/na governança? Lógico que leis e normas são imprescindíveis. Jurisprudência desejável. Mas decisões previsíveis e eficazes dependem de muito mais.


Não tome por menoscabo: O que é um porto? Qual a função deles? Compreendê-lo e, principalmente, procurar construir entendimento mais uniforme podem facilitar as discussões. Não se iluda: muitas das ideias, à primeira vista brilhantes, e tantas divergências decorrem da adoção de premissas distintas.


Um porto pode ser visto como uma superposição de fluxos: de cargas, de pessoas, de veículos e de riquezas. Portanto, gerir um porto é gerir fluxos.


Portos são entes físicos: território, imóveis, equipamentos etc. Mas é mais que isso: eles são elo de cadeias logísticas, arranjos institucionais/organizacionais e agentes de desenvolvimento econômico e social. Portanto, gerir um porto é gerir relações – em geral onde se concentram os imbróglios! Regra simples: deu para tirar foto? Pouca chance de estar aí o problema; a trava!


Relações, aliás, complexas: atores privados (operadores, arrendatários, práticos, transportadores, sindicatos de avulsos, etc.) e diversos agentes públicos (autoridades – quase uma dezena; das quais a autoridade portuária é, apenas, uma delas) convivendo nesse locus. Ou seja, independentemente de lei, porto sempre foi uma PPP, ainda que implícita. Agrava a complexidade o fato de que seus integrantes atuam de forma bastante autônoma, e de que as autoridades integram estruturas de ministérios diferentes, com corpos próprios de leis e normas, muitas vezes referenciadas a capítulos distintos da Constituição.


Com múltiplos componentes, relações multilaterais, compartilhamento de autoridade, diversos fluxos para serem geridos, fica fácil concluir: I) a decisão de usar um terminal ou um porto, ou de nele investir, depende de múltiplos fatores e interlocutores; razão pela qual segurança jurídica é necessária, mas não suficiente. II) regulação (portuária ou logística?) tem suas especificidades; cabe falar também de governança “condominial”; razão pela qual compliance precisa ir além de normas e/ou probidade. 


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