Frederico Bussinger: Privatização portuária para os não diretamente envolvidos

Grande risco, nesse momento delicado da vida nacional, é parar o setor no aguardo de resultado dos três estudos contratados

Por: Frederico Bussinger  -  02/10/20  -  18:37
Privatização portuária para os não diretamente envolvidos
Privatização portuária para os não diretamente envolvidos   Foto: Ilustração: Padron

Para uso corrente, trata-se de privatização de autoridades portuárias. Mas os estudos recém contratados pelo BNDES, para o PPI (Programa de Parcerias de Investimentos), são mais genéricos e complexos e podem ter resultados mais abrangentes... ou mais limitados: “avaliação, estruturação e implementação ... de participação da iniciativa privada para administração e exploração do Porto Organizado de Santos e de São Sebastião, considerando em seu escopo as possibilidades tanto de desinvestimento como de desestatização da CODESP” (Request For Proposal nº 01/2020 - tipo edital para os convidados). 


A se observar: i) Um contrato; dois portos: Santos e São Sebastião. ii) Foco nos portos e não nas suas autoridades-administradoras (distinto do principal objeto explicitado para os portos capixabas no Pregão AARH-12/2019); iii) Participação e não desestatização (idem). iv) Além de administração, também a exploração do porto organizado; v) Explicitação da (empresa) CODESP (Companhia Docas do Estado de São Paulo), mas não da Docas de São Sebastião; vi) Desinvestimento, além de desestatização (privatização); vii) E, isso, como uma possibilidade; não como uma decisão. 


Em síntese, pelo objeto contratual, tudo está em aberto; conclusão reforçada pela exemplificação das sistemáticas admitidas: i) alienação do controle acionário, ii) IPO, iii) outorga para administração e exploração da infraestrutura e serviços por nova sociedade, com a dissolução e liquidação da CODESP; além de outras previstas no art. 4 da Lei nº 9.491/97 (pg. 47 do TR): sete incisos, destacando-se abertura de capital e venda de bens imóveis de domínio da União.


E é bom que assim seja, pois, se entre os diversos atores e grupos de interesse do setor, há bastante alinhamento quanto aos sintomas dos males portuários brasileiros, sobre as relações causa-efeito, bem longe disso estamos. Assim, a prescrição de medicamento ao paciente, sem um diagnóstico ou uma pauta razoavelmente clara e acordada, poderá resultar na reedição de experiências anteriores de desperdício de tempo e recursos, e/ou de resultados aquém do imaginado. Sem falar em riscos de efeitos colaterais indesejáveis.


Por que, p.ex, analisar apenas a privatização, um remédio genérico ou antibiótico de largo espectro? Por que não, também, em conjunto, a autonomia de gestão das autoridades-administradoras, ou a descentralização do processo decisório, medicações específicas, testadas e aprovadas nos portos mundo afora, já há longo tempo? Vale repetir que autonomia portuária (modelo Land-Lord à frente) não é algo exclusivo de Roterdã, Hamburgo, Antuérpia ou portos europeus em geral: está no DNA, também, dos modelos praticados nos USA, na Ásia, na maioria da África e, até, da China e nossos vizinhos latino-americanos.


Além dos traços que podem ser considerados brasileiros, em termos de arcabouço jurídico, organização da economia e mesmo cultura, há especificidades portuárias e regionais. P.ex: os portos arrolados no pacote capixaba já são distintos entre si, e o são, também, de Itajaí e Santos. Este e São Sebastião, parte do mesmo pacote, também diferem entre si: por que juntos, então? Aliás, o grande desafio de São Sebastião não é nem o modelo: é ser! É implantar sua expansão que patina há uma década.


Grande risco, nesse momento delicado da vida nacional, é parar o setor no aguardo de resultado dos três estudos contratados – repetindo-se o ocorrido enquanto se aguardava a MP-595/2012 (conhecida como a MP dos Portos). Aliás, mesmo tendo escopos específicos, os estudos podem ser subsídios importantes, desde que se tenha uma pauta de reformas acordada e um processo de discussão organizado.


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