Frederico Bussinger: Possíveis legados da Covid-19, até para mobilidade e logística

O grande legado para esses setores deve ser a aceleração da entrada no mundo digital e virtual

Por: Frederico Bussinger  -  20/03/20  -  18:45
Atualizado em 20/03/20 - 19:03
Porto norte-americano movimentou um total de 1,5 milhão de TEU no primeiro semestre deste ano
Porto norte-americano movimentou um total de 1,5 milhão de TEU no primeiro semestre deste ano   Foto: Divulgação

“Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia...” (Lulu Santos - “Como uma onda”)


Lembra-se de algum caderno natalino, de grande jornal, desses com balanço do ano e previsões para o seguinte, cogitando para o futuro próximo de algum quadro dramático, de abrangência planetária? Algum especial de TV mencionando qualquer crise dessa escala? Surpreende que já havia diagnósticos da Covid-19 em Wuhan desde o início de DEZ/2019!


Nada singular: ao longo da saga humana, muitos outros episódios imprevistos, localizados ou pequenos, acabaram surpreendendo, se agigantando e mudando o rumo da história. Só neste século, foram três, com dinâmicas distintas: o 11/SET (2001) começou pelas instituições, afetou a economia e daí a população; a “crise do sub-prime” (2008), impactando a economia, instituições e população; e a Covid-19 (2020), que começou pela população, abalou instituições e já está afetando a economia. Todos atingiram em cheio a Europa. Mas as duas primeiras nasceram nos EUA. A última, na China.


Em semanas, ou poucos meses, eventos culturais e esportivos serão retomados, o comércio voltará a funcionar, o transporte de passageiros internacional também, pessoas deixarão suas quarentenas. O PIB de muitos países será menor este ano, e demorará para voltar aos níveis prévios.


Algumas mudanças na nossa vida, economia e sociedade serão transitórias. Outras de prazo maior. Mas, seguindo o rastro de eventos dessa proporção e abrangência, algumas inflexões serão perenes; ou, ao menos, apontarão novos rumos. Escassez e quarentenas, já começam a discutir analistas, devem alterar a natureza, hierarquia e/ou balanços de valores, relações interpessoais e familiares, arranjos sociais e políticos. 


O protagonismo dos socorristas (não apenas da saúde) parece estar em alta, vis-à-vis dos marqueteiros; pois a realidade cobra em tempo real! De quem faz ante quem fala. Mas será que a solidariedade, que emergiu em pequenos gestos, será doravante revalorizada ante o individualismo que parecia uma tendência? Globalismo X nacionalismo?


Pelas medidas governamentais da última semana, incluindo o “estado de calamidade” até o final do ano, tem-se a impressão que a agenda político-administrativa já foi ou será alterada: ante a demanda de suprir necessidades básicas da população e de manter um nível mínimo de atividade econômica, o ajuste fiscal e/ou equilíbrio das contas públicas parece ter passado a segundo plano; e as reformas tributária e administrativa deverão ficar para mais adiante.


Mas a Covid-19 também pode deixar marcas perenes na mobilidade e logística: p.ex, a experiência de supermercados, antecipando horários de abertura para idosos, pode alavancar, definitivamente, a implantação de escalonamentos de horários; projeto que enfrenta grande resistência em tempos de normalidades. 


Mas o grande legado para esses setores deve ser a aceleração da entrada no mundo digital e virtual: teleconferências, internet das coisas, uso de “big-data” e inteligência artificial, “porto-sem-papel” deverão se desvencilhar de amarras dos “tempos de paz” e serem irreversivelmente alavancadas. A discussão santista da escalação digital, no posto de escalação da Ponta da Praia, anteontem, é um exemplo.


Pode ser que, em pouco tempo, ao invés de segmentadas em pessoas, cargas e serviços, a mobilidade e logística, para fins de planejamento e gestão, o sejam em massa, energia e informação... como contribuição da Covid-19.


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