Frederico Bussinger: Ferrovias podem morrer na praia... de Santos

As metas ferroviárias do Plano Mestre (para o complexo portuário santista), incluindo as do Plano de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ, para o porto organizado), são bastante ambiciosas

Por: Frederico Bussinger  -  18/12/20  -  14:42
 Frederico Bussinger: Ferrovias podem morrer na praia... de Santos
Frederico Bussinger: Ferrovias podem morrer na praia... de Santos   Foto: Ilustração: Padron

“Chegar é uma coisa; ultrapassar é outra” (Bordão da F1)

O mapa das ferrovias em solo paulista lembra uma mão espalmada. Nela a palma seria a macrometrópole e os dedos (na diretriz noroeste), a MRS, a FCA (gerida pela VLI) e as duas malhas da ALL (geridas pela Rumo): Oeste e Paulista. Essas se ligam às malhas Sul, Norte e FNS, malhas de outros estados, concessões também da Rumo. 


De uma mão espalmada, essas sete ferrovias passam a parecer uma árvore, analogia que permite incluir as duas descidas da Serra, suas “raízes”: i) a cremalheira (São Paulo Railway - 1867, depois Santos-Jundiaí), e ii) a descida “em gravidade” (Sorocabana - 1937).


Ao chegar à Baixada, é como se essas “raízes” se espalhassem: o Plano Mestre vigente (pg. 85) organiza-as em dez trechos para análise. E quando consideradas também as diferentes bitolas (métrica, larga e mista) e administradoras (MRS, Rumo, VLI e Portofer), quase faltam cores para distingui-los, mesmo porque os trechos de cada um não são contínuos (vide, também, Figs. 50 e 51 do PDZ).


Assim, desafios se impõem, qual seja, a compatibilização das capacidades de cinco grandes conjuntos: i) sete malhas interiores; ii) a transposição da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP); iii) a descida da Serra; iv) a circulação na Baixada; v) a circulação interior, tema da coluna de 2/AGO/19, logo após o leilão da FNS: “Após alcançar, o desafio da ferrovia é entrar no porto”.


De imediato a capacidade de projeto. Mas, a seguir, também alinhamentos no timing de implantação e operacional.


Tais dificuldades seriam hoje menores se a proposta do CAP/Santos tivesse sido encampada pelo MT e/ou BNDES na modelagem para as concessões ferroviárias (1995/98): i) excluir todos os trechos ferroviários da Baixada das concessões; ii) agregá-las; e iii) outorgá-las para gestão centralizada e articulação com as concessões no primeiro pátio de intercâmbio (pg. 83). Nesse contexto, seria implantada a “Ferradura” e um CCO. Chegou-se a discutir algo semelhante para as malhas do “Planalto de Piratininga” (RMSP) e, até, a gestão unificada de ambas. 


Enfim, algo muito em linha com estratégias adotadas, p.ex, para a “Betuwe Line” (Rotterdam) e a “Chicago ring” (anel da “capital ferroviária dos USA”). 


Tal proposta foi aprovada pelo colegiado, formalizada e discutida, salvo engano, em mais de uma reunião. Numa dessas, ouviu-se de um diretor do BNDES algo mais ou menos assim: “O importante agora é privatizar: esses problemas o mercado resolve!”... o que, ¼ de século depois, ainda não aconteceu!


As metas ferroviárias do Plano Mestre (para o complexo portuário santista), incluindo as do Plano de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ, para o porto organizado), são bastante ambiciosas. Entre elas, está elevar a participação ferroviária de 28% para 47% na matriz de transportes interiores. Registre-se, em um porto que se propõe também expandir: das atuais 133,1 para 280,1 Mt/ano (50% até 2040!). Em termos absolutos, isso significa aumento para 80 sobre as 45 Mt/ano atuais: “129 Mt em 2060, o que representa cerca de quatro vezes o volume observado em 2016” (pg. 84).


Ou seja, além complexo e desafiador, é também urgente!


Além da oportunidade, quando da desestatização dos anos 90, uma segunda foi também perdida quando se assinou o contrato da Portofer (2000). Recentemente uma terceira, quando da renovação antecipada da Malha Paulista (Rumo). 


Duas novas oportunidades estão à frente: a renovação antecipada da MRS e o fim do contrato da Portofer – oportunidades para uma solução sistêmica que não podem/devem ser desperdiçadas, sob risco de, depois de tanto esforço, as ferrovias (todas elas) acabarem por “morrer na praia”... de Santos.


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