Crise no Canal de Suez afetará o Porto de Santos

Interrupção do tráfego em uma das principais rotas de navegação do mundo deve gerar atrasos e aumento no custo do frete marítimo no cais santista

Por: Fernanda Balbino & Da Redação &  -  28/03/21  -  15:20
Encalhamento no Canal de Suez
Encalhamento no Canal de Suez   Foto: Divulgação

O Canal de Suez, uma das principais rotas marítimas do mundo, segue bloqueado pelo porta-contêineres EverGiven e pode levar vários dias para ser liberado. Centenas de navios aguardam o desencalhe para seguir viagem entre a Ásia e a Europa. E os impactos logo chegarão ao cais santista, segundo especialistas. O aumento de custos causado por atrasos ou desviode rotas estão entre eles. E as despesas extras podem ser repassadas ao consumidor.


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O navio encalhou na terça-feira passada. Na última sexta-feira, durante todo o dia, equipes de resgate enfrentaram dificuldades para desencalhar a embarcação de 400 metros de comprimento e 220 mil toneladas, capaz de transportar até 20 mil TEU (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés).


Equipes de outros países foram chamadas para ajudar no trabalho. A estratégia inicial, de escavar a área onde a proa (frente) do navio encalhoue empurrá-lo, não funcionou até agora. Empresas avaliam que os trabalhos podem demorar até semanas.


“Os reflexos serão imediatos caso demore para desencalharo navio, com o bloqueio do tráfego, com elevação dos fretes, possivelmente, e o aumento de custos para os armadores, além das mudanças de rotas ou cancelamentos de viagens”, afirma o diretor-executivo do Sindicato das Agências de Navegação Marítima do Estado de São Paulo (Sindamar), José Roque.


O temor de encarecimento de fretes já circula no mercado internacional. As armadoras Maersk e Hapag-Lloyd consideram desviar os seus navios pela África, evitando o congestionamento no Canal de Suez. No caso da primeira, a empresa iniciou o desvio de embarcações que têm capacidade e combustível suficiente para uma mudança de rota.


A Maersk também já avalia soluções alternativas, como transporte aéreo e ferroviário para cargas urgentes que ainda estão na origem ou em outro lugar. Já a Hapag-Lloyd tem seis navios afetados. “A Hapag-Lloyd monitora constantemente a situação e acompanha de perto as implicações em seus serviços. No momento, estamos investigando possíveis desvios de embarcações ao redor do Cabo da Boa Esperança”, aponta a empresa, em comunicado.


O trajeto passando pelo extremo sul da África aumenta em, pelo menos, uma semana o tempo de transporte de cargas. A medida tambémamplifica os problemas que as empresas de transporte já enfrentam, como os transtornos causados pela pandemia de covid-19. Os atrasos no fornecimento de suprimentos e de bens de varejo estão entre esses reflexos.


Rotas


Para o economista Helio Hallite, especialista em comércioexterior, os impactos no Porto de Santos são relativos. “A rota de exportações e importações para o Oriente não depende do Canal de Suez. Porém, as cargas originárias da Ásia que eventualmente façam transbordo em Algeciras (Mediterrâneo) ou portos do Norte Europeu chegarão por aqui com atraso, evidentemente se os navios estiverem no supercongestionamento naval que se formou”, explica.


A alternativa, segundo o professor universitário, é utilizar o Cabo da Boa Esperança para a rota entre Ásia e Europa. A viagem leva 11 dias, uma alternativa mais rápida diante das incertezas relacionadas à liberação do Canal de Suez.


“O navio Ever Given entrará para a história da navegação como aquele que, por causa de um vendaval, originou um prejuízo de US$ 400 milhões por hora, sim, por hora. A rota mais curta para ligar a Ásia ao Mediterrâneo e Atlântico Norte está interrompida. E o pior: sem previsões para o desencalhe. E 12% do comércio marítimo passam por Suez”, aponta Hallite.


Incertezas


Para o presidente do Centro Nacional de Navegação Transatlântica (Centronave), Claudio Loureiro, o incidente afeta diretamente os mercados europeu e asiático, e há a possibilidade de algum “efeito cascata” no comércio mundial, já que 12%de tais fluxos transitam pelo Canal de Suez, notadamentecargas de petróleo.


No entanto, segundo o executivo, qualquer previsão, neste momento, no que se refere ao impacto real nacadeia global de suprimento e no comércio exterior brasileiro, é muito prematura e incompleta. “Trata-se ainda de uma conjectura, sem motivos para alarmismo, uma vez que dependerá principalmente, mas não unicamente, de quanto tempo a rota pelo Canal permanecerá interrompida, o que hoje não é conhecido”, afirma o presidente do Centronave.


Acidentes podem ocorrer no cais santista, diz especialista


Acidentes como o que ocorreu no Canal de Suez, no Egito, podem acontecer em qualquer via navegável estreita e que receba grandes embarcações. A combinação de largura reduzida e cargueiros cada vez maiores também é uma realidade no Porto de Santos. E, segundo o presidente da Praticagem de São Paulo, Bruno Tavares, um acidente desse tipo pode acontecer no cais santista, desde que não sejam tomadas as precauções necessárias.


“Em qualquer canal estreito é possível acontecer isso com navios de grandes dimensões. Dependendo do trecho em que a embarcação estiver passando, caso haja problema como o de Suez, o navio poderia ficar atravessado também”, afirma o presidente da entidade que reúne os práticos que atuam nos portos de Santos e São Sebastião, no Litoral Norte.


De acordo com Tavares, a possibilidade de um acidente cresce conforme o tamanho das embarcações. E, no mês passado, a Marinha do Brasil autorizou o tráfego de cargueiros com até 366 metros no canal de navegação do cais santista. Com isso, a preocupação e os cuidados aumentam.
“À medida que osnavios vão crescendo de tamanho, o risco também aumenta. Nós, da Praticagem de São Paulo, nos preparamos sempre que navios de maiores dimensões, como os de 366 metros, começam a operar no Porto. Nesse caso, além de simulações realizadas no Tanque de Provas Numérico da USP, investimos também em treinamentos em modelos tripulados, em Covington, nos Estados Unidos”, explica o profissional.


Para garantir que as manobras de entrada e saída de cargueiros vão acontecer de maneira adequada e sem riscos de eventuais acidentes, a Praticagem investe em treinamento e inovação. “É preciso se certificar de que todas as medidas de segurança estão sendo adotadas ao manobrar um navio desse porte. Nosso exemplo seria o de 366 metros. Daí a importância de práticos qualificados, infraestrutura e tecnologia adequadas para garantir que a navegação no canal e a manobra sejam seguras, além da fiscalização das autoridades marítima e portuária”.


Tavares aponta o impacto de um acidente como o de Suez no cais santista. “Um navio atravessado no canal do Porto de Santos impediria o tráfego de navios, o que impactaria diretamente na economia do Brasil”.


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