Alexandre Machado: O Transporte Marítimo Internacional e a Regra IMO 2020 (parte 1)

Advogado e professor do Centro Paula Souza comenta que a regra sobre emissão de enxofre pede análise aprofundada

Por: Alexandre Machado  -  15/08/19  -  20:14
  Foto: Arquivo

Atualmente, o Transporte Marítimo Internacional impulsiona o comércio global, movimentando anualmente mais de 10,7 bilhões de toneladas de contêineres, sólidos e granéis líquidos pelo mundo, segundo dados da UNCTAD sobre Transporte Marítimo (2018). 


Para atender a esta demanda, utiliza-se de combustível com alto teor de dióxido de enxofre (SOx), representando em emissões de Gases de Efeito Estufa cerca de 3,5%, devendo obrigatoriamente ser reduzido para 0,5% até 1º de janeiro de 2020, conforme o Anexo VI da Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios MARPOL da Organização Marítima Internacional (IMO). 


Diante desse novo contexto, surge a necessidade de uma análise mais aprofundada sobre a Regra IMO para Limitação de Emissões de Enxofre 2020, tendo em vista faltar apenas 5 meses para sua implantação. Assim, em um primeiro momento, se contextualizará a regra e seus principais efeitos e, posteriormente, os seus reflexos no Brasil e em nossa região, responsável por hospedar o maior porto brasileiro. 


Para tanto, o novo limite poderá ser atingido utilizando Gás Natural Liquefeito (GNL), combustível limpo (até 0,5%) ou pela instalação de depuradores (para utilização de combustível convencional). Vale destacar que o novo limite global não altera os 0,10% das atuais áreas de Controle de Emissões de SOx (ECAS) previstas pelo Anexo VI da MARPOL, em janeiro de 2015. 


O efeito dessa regulação gerou impactos diretos sobre os custos do combustível (bunker), pois há uma variação global média de US$ 250 por tonelada métrica entre combustíveis de alto e baixo teor de SOx. Vale dizer que as principais companhias marítimas já aplicam as taxas em suas faturas desde 1 de janeiro de 2019, através de fórmulas específicas, antes mesmo da implementação definitiva do regulamento. Como exemplo podemos citar MSC - Bunker Charge Mechanism (BRC); Hapag-Lloyd - Marine Fuel Recovery (MFR); Maersk Line - Bunker Adjustment Factor (BAF); APL/CMA CGM - Bunker Adjustment Factor (BAF) e a One - ONE Bunker Surcharge (OBS). 


De acordo com a Argus Marine Fuels (2019), no caso das linhas de contêiner, a taxa estimada para combustível de baixo teor de enxofre poderia aumentar até 33% por tonelada métrica, o que representaria um custo ao transportador de cerca de US$ 150 - US$ 200 por TEU, podendo chegar até US$ 500, no caso dos containers refrigerados – muito embora os custos variem de acordo com a duração da viagem, capacidade do navio e das condições do mercado. 


Nesse cenário, reflexos ocorreram em toda cadeia de fornecimento, pois a crescente demanda do setor de transporte marítimo por combustível limpo forçará o preço a subir, não apenas para o transportador marítimo, mas também para o setor rodoviário e ferroviário, pois o combustível limpo, ao contrário de sua contraparte, concorrerá no mesmo mercado do diesel terrestre.


Uma alternativa, ainda que inicialmente onerosa para sua implantação, é o abastecimento com GNL, já utilizado em algumas das principais rotas costeiras e, segundo a Korean Development Bank and Korea Trade-Investment (2019), já adotado por 60,3% das novas embarcações encomendadas até 2025. Trata-se do combustível mais barato e benigno em termos ambientais, muito embora para o seu abastecimento, requeira uma infraestrutura diferenciada pela disponibilidade de GNL. 


É certo que cada opção tem vantagens e desvantagens baseadas no custo e na disponibilidade de combustível e infraestrutura, sendo que os portos e os operadores de terminais devem garantir uma infraestrutura eficiente sob pena de perda de mercado. Nesse sentido, vale recordar o que diz o último Relatório da UNCTAD sobre Transporte Marítimo (2018)


Este afirma que, com as novas alianças e o tamanho dos novos navios, “ as companhias poderão forçar os portos a adaptar a sua infraestrutura às necessidades do transportador, aumentando assim a concorrência entre os portos de contêineres para garantir o desembarque, deixando a decisão sobre a capacidade de despacho, portos de desembarque e estrutura de serviços nas mãos dos armadores”.


Essa dinâmica tem sido complicada porque as linhas marítimas estão geralmente envolvidas nas operações portuárias, o que, por sua vez, redefine a abordagem das concessões portuárias no contexto internacional, ou seja, um novo modelo portuário se fará necessário, buscando atender essa nova demanda. Surge então a seguinte indagação: A infraestrutura portuária brasileira estaria preparada? Continua.


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