'Este é um dos anos mais difíceis que a gente já teve para a Educação', diz Tabata Amaral

Confira trechos da entrevista que a parlamentar concedeu, com exclusividade, para A Tribuna

Por: Egle Cisterna & Da Redação &  -  28/05/19  -  01:23
"A mobilização que vimos dia 15 foi muito bonita. Fazia tempo que o Brasil não se unia"   Foto: Vanessa Rodrigues

A voz mansa e o rosto de menina podem passar aos desavisados a impressão de que a deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP) não é uma pessoa de briga. Mas, para defender algumas de suas causas, sem perder a suavidade na fala, ela está pronta para a luta. Aos 25 anos, a paulistana, que nasceu na periferia da Zona Sul da Capital, está em seu primeiro mandato, tendo sido a sexta candidata mais votada no Estado. Filha de uma doméstica e de um cobrador de ônibus, teve bom desempenho na escola pública, o que fez com que conseguisse uma bolsa de estudos em uma escola particular. Foi também com uma bolsa de estudos que ela se formou na Universidade Harvard, nos Estados Unidos, em Ciências Políticas e Astrofísica. E foi defendendo a bandeira da Educação que ela questionou a falta de projetos do ex-ministro da Educação Ricardo Velez, o que foi considerado por muitos um dos motivos da demissão dele da pasta. Confira trechos da entrevista que a parlamentar concedeu, com exclusividade, para A Tribuna:


A Educação tem sido um tema polêmico na atual gestão federal, com os cortes de verbas e a discussão da ideologia no ensino. Essa é a sua principal bandeira. Como vê essa situação?


Este é um ano bastante duro para a Educação, um dos mais difíceis que a gente já teve. Nestes primeiros meses de governo, a gente viveu uma grande paralisia, com polêmicas, desmandos, demissões, em que a maior crítica era, de fato, a ausência de qualquer projeto. Na sequência, a gente tem um novo ministro que, ignorando o atraso, por exemplo, no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e no Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), começa a empreender guerra ideológica contra só Deus sabe o que, mas que está prejudicando muito a Educação Básica, o Ensino Superior, a pesquisa no País. É muito preocupante o que está acontecendo.


Os parlamentares estão tomando alguma atitude para reverter isso?


Lá no Congresso, a gente tem uma comissão externa, que eu coordeno, para acompanhar o MEC, para que a gente não espere mais três meses e perceba que o ano se perdeu para a Educação. Eu estou na comissão de Educação, cobrando o ministro, dando bastante trabalho a ele, porque é muito grave o que está acontecendo. Mas o que a gente viu na quarta-feira retrasada (mobilização nacional do dia 15 de maio) foi muito bonito. Fazia tempo que o Brasil não se unia ao redor de nada. Eu vi pessoas, que votaram ou não no Bolsonaro, indo às ruas pela Educação e me deu muito orgulho e muita alegria. E ficou uma mensagem bem clara de que a Educação pode unir o País.


O Brasil tem até o final deste ano para revisar o Fundeb, que vence em 2020. Como estão as discussões?


A gente tem um desafio muito grande, porque o Fundeb é responsável por cerca de R$ 6,00 de cada R$10,00 da Educação Básica. É ele que responde pelo transporte escolar, pela formação de professores, por salários. O Fundeb vence no próximo ano e o Executivo não está sendo ativo neste processo. A gente tem uma Comissão Especial na Câmara, que está analisando uma proposta, e a nossa missão é não só colocá-lo na Constituição para que não fique à mercê de mais nenhum Governo, mas também torná-lo mais redistributivo, melhorar regras, aumentar a complementação da União e fazer com que ele seja um indutor de Educação de qualidade.


Outro diferencial no seu mandato é o fato de ser uma mulher jovem, vinda da periferia, um perfil bem diferente na política tradicional.


Com certeza, incomoda muito essas novas caras que chegaram ao Congresso, porque, até então, a política foi feita majoritariamente por homens, com os mesmos sobrenomes, das mesmas famílias, mais velhos, brancos. Não tem nenhum problema você ter essas características, mas o Brasil é muito mais complexo do que isso. Causa espanto ver alguém como eu lá. E vêm os questionamentos, as piadinhas, o assédio, mas a gente nasce guerreiro nas periferias. Eu estou sempre respondendo, sempre falando e eu acho que a perspectiva de que mais mulheres, mais periféricos e, por meio de outros parlamentares, mais gays, lésbicas e mais negros ocupem a política é muito grande. Nosso papel é só dar aquele empurrãozinho na porta para que mais pessoas que têm a cara do Brasil cheguem ao poder e, de fato, que a nossa democracia seja mais completa, mais complexa e mais profunda.


E como é renovar a política depois de uma eleição presidencial em que as redes sociais ganharam muita força?


Eu tenho atuação em quatro áreas principais: Educação, Direito das Mulheres, Inovação Política e como pensamos o futuro em termos de mudança climática, desemprego, desigualdade. Uma das inovações das quais eu tenho mais orgulho é o Gabinete Itinerante (projeto em que a deputada leva sua equipe a cidades de São Paulo para ouvir a população). Com as redes sociais, muita gente acredita que fazer uma enquete no Facebook é você dialogar com as pessoas. E esquece que muitas pessoas não estão nas redes ou, se estão, não acompanham as páginas de políticos. Esquece-se também o papel que robôs e o dinheiro têm nas redes sociais. Eu sou muito grata pelas minhas redes, que me ajudam a chegar em muita gente. Mas, para ouvir mesmo as pessoas, eu tenho que chegar a onde elas estão.


Outro tema que promete discussões acaloradas neste ano é a reforma da Previdência. Como vê essa questão? Acredita que possa ser votada ainda em 2019?


Eu tenho uma visão sobre a reforma que é bem diferente dos dois lados. Vejo como uma reforma que é muito necessária, mas que, nela, você consegue empreender uma luta social. Então, enquanto a gente vê pessoas mais da esquerda dizendo que não existe um problema e que está tudo bem a gente ver pessoas se aposentando com R$ 40 mil, R$ 100 mil por mês, que tudo bem a gente não ter dinheiro hoje para a Educação, eu acho que isso é um pouco desonesto com o povo.


Concorda com o que está sendo proposto pelo governo?


A nossa Previdência de hoje acaba aumentando a desigualdade e isso não está certo. Mas, por outro lado, a gente tem um governo que olha para a reforma como um meio de economizar dinheiro, que não tem muito receio de acabar com direitos básicos, de tirar dinheiro de quem está na ponta. Isso me coloca no meio do caminho. Eu entendo a necessidade de uma reforma, a gente está apresentando, junto com os outros dois parlamentares do Movimento Acredito, 11 emendas à proposta do governo. Eu não posso deixar que o governo cometa as atrocidades que está cometendo com a proposta deles. A gente está na luta para não mudar o BPC (Benefício de Prestação Continuada), a aposentadoria rural, a aposentadoria dos professores. A gente está na luta para colocar uma trava nos supersalários, para ajudar quem fica desempregado por mais de cinco anos.


O seu nome já foi cotado para a candidatura a prefeita de São Paulo.


Eu não sou candidata para as eleições de 2020. Fui a sexta pessoa mais votada de São Paulo, a segunda candidata mais votada do Brasil que pertence à oposição. As pessoas me elegeram para estar no Congresso lutando pela Educação, não para usar isso de trampolim.


Quais os seus projetos políticos para o futuro?


Não sou candidata, mas tenho uma missão muito grande para o Estado de São Paulo, que é eleger mais pessoas, mais mulheres, mais jovens, mais periféricos. Estou conversando com pessoas no Estado inteiro que querem se candidatar e minha missão para o PDT na Capital, que é bem ousada, é que metade dos nossos candidatos seja de mulheres. Assim, vai ser o primeiro partido a fazer isso na história do Brasil.


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