Bolsonaro volta a minimizar efeitos da pandemia e defende isolamento 'vertical'

Presidente repete fala em tom político após pronunciamento em rede nacional; entidades médicas consideram intolerável e irresponsável o “discurso da morte”

Por: Eduardo Brandão  -  25/03/20  -  14:25

Pouco mais de 12 horas após pronunciamento em rede nacional, o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), repetiu na manhã desta quarta-feira (25) o discurso contrário às medidas de isolamento e quarentena tomadas por governos estaduais no combate ao coronavírus.  


Em uma transmissão nas redes sociais e na saída da residência oficial do Palácio da Alvorada, ele voltou a defender o chamado isolamento “vertical”, em que apenas os grupos de risco (idosos e portadores de doenças crônicas) ficariam em casa.  


O bloqueio epidemiológico é recomendado pelas autoridades sanitárias, como a Organização Mundial da Saúde (OMS). Em estados brasileiros, como São Paulo e Rio de Janeiro, os governos determinaram fechamento temporário do comércio, escolas e serviços não-essenciais para evitar o avanço do vírus. A medida é para reduzir o ritmo de contágio e evitar colapso na rede pública de Saúde. 


“O que estão fazendo no Brasil, alguns poucos governadores e alguns poucos prefeitos, é um crime. Eles estão arrebentando com o Brasil, estão destruindo empregos. E aqueles caras que falam “ah a economia é menos importante do que a vida”. Cara pálida, não dissocie uma coisa de outra. Sem dinheiro, sem produção – porque o homem do campo também vai deixar de produzir – nós vamos viver do quê?", afirmou o presidente a jornalistas na saída da residência oficial do Palácio da Alvorada. 


Mesma linha de discurso foi usada pelo presidente em entrevista ao canal pago CNN, na manhã desta quarta (25). Bolsonaro afirmou que está conversando com o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, para que o ministério passe a adotar a orientação de isolamento vertical.  


"Conversei por alto com Mandetta ontem (terça), hoje (quarta) vamos definir essa situação. Tem que ser, não tem outra alternativa. A orientação vai ser o vertical daqui para frente. Vou conversar com ele e tomar a decisão. Não escreva que já decidi, não. Vou conversar com Mandetta”. 


Classe médica se posiciona


Em nota conjunta, as entidades de saúde coletiva e da bioética consideram intolerável e irresponsável o “discurso da morte” feito pelo Presidente da República, na noite de 24 de março, em cadeia nacional de rádio e TV. 


“Nessa manifestação, incoerente e criminosa, o sr. Jair Bolsonaro, no momento ocupante do principal cargo do Executivo Federal, nega o conjunto de evidências científicas que vem pautando o combate à pandemia da COVID-19 em todo o mundo, desvalorizando o trabalho sério e dedicado de toda uma rede nacional e mundial de cientistas e desenvolvedores de tecnologias em saúde”, cita o comunicado.  


As entidades afirmam que a palavras do presidente “desrespeita o excelente trabalho da imprensa e de numerosas redes de difusão de conhecimento, essenciais para o esclarecimento geral sobre a COVID-19, e desmobiliza a população a dar seguimento às medidas fundamentais de contenção para evitar mortes”. 


Segundo as entidades, as instituições da República precisam “reagir e parar a irresponsabilidade do ocupante da cadeira de presidente antes que o caos se torne irreversível”. Citam ainda que as medidas adotadas pelas autoridades sanitárias são “cruciais encaminhadas com muito esforço pelas autoridades municipais e estaduais, implementadas por técnicos e profissionais do SUS, os quais vêm expondo suas vidas para salvar pessoas.  


Dizem ainda que o discurso comete o crime de “infração de medida sanitária preventiva”, a ser enquadrado no Art. 268 do Código Penal Brasileiro, ao desrespeitar “determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”. 


Assinam esta nota as seguintes entidades: 


Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO 


Centro Brasileiro de Estudos da Saúde – Cebes


Associação Brasileira de Economia da Saúde – ABrES 


Associação Brasileira da Rede Unida 


Associação Brasileira de Enfermagem – ABEn 


Associação Paulista de Medicina  – APM 


Sociedade Brasileira de Bioética – SBB 


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