Cinco pessoas são condenadas por pagamento e recebimento de propina na Marinha

Propina era utilizada para a emissão de títulos de inscrição de embarcação (TIEs). Outras três pessoas foram absolvidas

Por: Eduardo Velozo Fuccia & Da Redação &  -  10/09/19  -  18:43
Um acusado é suboficial da reserva remunerada da instituição e atuava na Capitania dos Portos
Um acusado é suboficial da reserva remunerada da instituição e atuava na Capitania dos Portos   Foto: Alexsander Ferraz/AT

A Justiça Militar da União condenou cinco pessoas por corrupção passiva e ativa, porque pagaram ou receberam propinas para a emissão de títulos de inscrição de embarcação (TIEs), sem a observância das regras exigidas pela Marinha. Um acusado é suboficial da reserva remunerada da instituição e atuava na Capitania dos Portos de São Paulo (CPSP), em Santos. Os demais são despachantes náuticos. Outros três réus foram absolvidos.


Em um período de sete meses, entre 1º de janeiro e 31 de julho de 2013, 620 embarcações foram beneficiadas com a fraude. Segundo o Ministério Público Militar (MPM), os réus “articularam um esquema criminoso para emitir rapidamente essa enorme quantidade de TIEs sem a necessidade de obediência às regras técnicas exigidas pela Marinha, tudo em troca de dinheiro dos proprietários e/ou de despachantes navais interessados”.


O juiz federal Ricardo Vergueiro Figueiredo, da 1ª Auditoria da 2ª Circunscrição Judiciária Militar, em São Paulo, reconheceu na sentença que “esse ecossistema pernicioso e criminoso compreendia uma fase que consistia na angariação de ‘clientela’. Nesta, o agente integrante da Marinha apresentava-se como aquele que poderia propiciar certa facilidade e celeridade na tramitação dos registros de inscrições das embarcações”.


A maior punição, de dois anos e oito meses de reclusão em regime aberto, com a possibilidade de substituição por duas sanções restritivas de direito por igual período, foi aplicada ao suboficial William Maia de Lima. O juiz reconheceu duas causas de aumento de pena, porque o militar da Marinha praticou crimes de corrupção passiva infringindo dever funcional e de forma reiterada, caracterizando a “continuidade delitiva”.


Acusados de corrupção ativa, consistente em subornar o oficial da Marinha, os outros quatro condenados receberam punição de um ano e quatro meses de reclusão, em regime aberto, concedido o benefício do 'sursis' (suspensão condicional da pena). Por meio da quebra dos sigilos bancários dos réus foram demonstrados transferências ou depósitos bancários realizados pelos despachantes em favor do suboficial.


Absolvidos


Entre os três absolvidos, está um primeiro-sargento da Marinha. De acordo com o MPM, para a emissão ilícita dos 620 TIEs foram utilizados login e senha desse militar, que negou qualquer participação no esquema. Em todos os casos, o banco de dados do Sistema de Gerenciamento de Embarcações da Marinha (Sisgemb) foi alimentado fora da Seção de Cadastro de Embarcações da CPSP, conforme atesta laudo pericial.


Embora o login e a senha sejam pessoais, o primeiro-sargento alegou que eles foram descobertos e indevidamente usados por terceiros, que não soube identificar. Como não ficou comprovado qualquer repasse para ele a título de propina, o juiz absolveu esse militar por insuficiência de prova. “Melhor absolver-se um possível culpado do que condenar-se um inocente”, fundamentou o juiz ao aplicar o princípio do 'in dubio pro reo'.


Com base no mesmo princípio, o magistrado inocentou dois despachantes, porque não se provou que pagaram qualquer quantia indevida ao suboficial. O advogado de um desses absolvidos é Fábio Hypolitto, que também defendeu a despachante Vanessa Rio Branco Pontes, condenada. Em relação a ela, Hypolitto sustentou que não houve pagamento de propina, mas gratificação de “valor simbólico” pela indicação de cliente.


Os demais despachantes condenados – Dalva Otaviana de Lima, José Carlos Barbosa Tesoto e Robson Felício – também negaram pagar propina para agilizar e facilitar e emissão de TIEs. Os dois primeiros justificaram que os valores repassados ao suboficial decorreram de “empréstimos”, pois o militar passava por dificuldades financeiras. O terceiro alegou que imaginou ser lícito o pagamento e refutou ter solicitado vantagem.


Advogado Fábio Hypolitto defendeu dois réus do processo
Advogado Fábio Hypolitto defendeu dois réus do processo   Foto: Divulgação

Sistema alterado


O esquema ilícito foi descoberto durante Inquérito Policial Militar (IPM) e motivou a Marinha do Brasil a criar o Grupo de Atendimento ao Público (GAP), segregando as funções de recebimento dos documentos e de lançamento dos dados no Sisgemb. Desse modo, evita-se o contato das pessoas que operam o sistema com as partes interessadas e, consequentemente, eventuais atos de corrupção na emissão dos TIEs.


“Foram realizadas mudanças significativas no procedimento para a emissão de documentação, visando obstar [dificultar] a repetição da prática fraudulenta, evitando, assim, transtornos para toda a sociedade. A Marinha do Brasil lamenta o ocorrido, reafirma a sua postura de zelar pela integridade na conduta de seu pessoal e não hesita em coibir tais práticas delituosas”, destaca nota da instituição.


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