Mundo celebra neste domingo o dia de proteção aos manguezais. Você faz sua parte?

O mangue que resiste na Zona Noroeste tem influência direta na vida de quem mora, por exemplo, no Embaré – ainda que pouca gente se dê conta disso

Por: Ronaldo Abreu Vaio  -  26/07/20  -  13:10
Voluntários participam de mutirão de limpeza em mangue da Zona Noroeste
Voluntários participam de mutirão de limpeza em mangue da Zona Noroeste   Foto: Isabela Carrari/Prefeitura de Santos

Se fosse uma cidade, seria restaurante e maternidade; se fosse uma cozinha, filtro e esponja. Por ser tudo isso, o mangue que resiste na Zona Noroeste tem influência direta na vida de quem mora, por exemplo, no Embaré – ainda que pouca gente se dê conta disso. Hoje, no Dia Mundial de Proteção aos Manguezais, esta reportagem pretende trazer o mangue ao centro de Santos, da Baixada Santista e do debate sobre preservação. Afinal, não é só de Floresta Amazônica que se faz um meio ambiente.


“O manguezal captura do ar cinco vezes mais gás carbônico do que a floresta tropical (da qual a Amazônia é um exemplo)”, começa o biólogo marinho e presidente da ONG Ecofaxina, William Rodriguez Schepis. Esse é só um dos atributos dos manguezais, que são um ecossistema costeiro, transição entre os ambientes marinho e terrestre. 


O solo é úmido, salgado e lodoso, rico em nutrientes. Por isso atrai ou cria uma rica fauna. Sabe o caranguejo? É apenas um tipo dos vários crustáceos que habitam o mangue ou nele se alimentam. Os crustáceos, por sua vez, vão servir de comida a outras espécies, como peixes, garças, biguás, guarás vermelhos e... nós, humanos, com nossas caranguejadas. Eis aí a faceta de restaurante do mangue. 


Quanto a maternidade, é uma das maiores dos oceanos. Muitas espécies se dirigem aos manguezais para se reproduzir. Estima-se que 70% do que o ser humano captura no mar se origina dos manguezais. Acabar com eles é afugentar as espécies do mar local. “E daí?”, podem perguntar. A resposta está na moqueca: vá salivando ao Novo Mercado de Peixes, na Ponta da Praia, e saia de lá acabrunhado e sem apetite pelos preços que irá encontrar. 


Filtro e esponja


Os manguezais se desenvolvem nas áreas em que há encontro de rios e mares. Não é diferente no estuário de Santos. Está presente no Rio dos Bugres, no São Jorge, no Casqueiro. Por sua característica, a terra do mangue filtra a água em movimento, retendo sedimentos, micro-organismos e, claro, a poluição. 


Esse processo contribui para amenizar a contaminação do mar, influindo nas condições de balneabilidade. “Se não houvesse o mangue, seria bandeira preta na praia, não vermelha”, afirma Schepis. Por outro lado, a fauna e flora do mangue também acabam contaminadas. 


Enchente. Quem nunca sofreu ou ouviu falar? Em Santos, são históricas. À parte o aumento no nível dos oceanos, que provocará episódios mais violentos, quanto menos mangue, pior a enchente: ele age como uma barreira de retenção quando a maré sobe. Pela característica lodosa do solo, à moda de uma esponja, absorve a água do mar, amortecendo a sua velocidade. 


“Quando você aterra o mangue, o mar não sabe. Ele continua o seu caminho, sem contenção alguma, com os prejuízos já conhecidos”, explica Ronaldo Christofoletti, professor do Instituto do Mar, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Mas quem aterra mangue hoje em dia? Aqui, depara-se com a ponta do iceberg de um problema mais profundo. 


Palafitas


Quando se fala que o Dique da Vila Gilda, em Santos, é a maior favela de palafitas do Brasil, na prática, diz-se duas coisas: que os deficits social e habitacional estão em vantagem contra a sociedade e que um mangue está em vias de extinção. 


O problema social tem ligação direta com a agressão ambiental. Schepis enfatiza que o lixo e a poluição do mar não são o palito de sorvete ou o copo plástico largados irresponsavelmente na areia, mas as garrafas PET e o esgoto descartados das palafitas. “A gente (Unifesp) tem trabalhado com crianças e jovens para mudar essa realidade”, diz Christofoletti. 


Dentre essas ações, há a de levar crianças das palafitas santistas ao mangue preservado de Bertioga. “Eles ficam impressionados, ‘então isso é o mangue?’. ‘Sim... e vocês moram no mangue”, conta Christofoletti. “Eles nasceram ali, para eles, esse é o real. Mas eles entendem que há outra realidade também”. 


Projetos


Um projeto que já tem mais de 10 anos pode auxiliar a diminuir o lixo nos mares da região e até de outras praias, mais longínquas. O Sistema Ambiental de Coleta de Resíduos foi elaborado por William Rodriguez Schepis, do Instituto Ecofaxina, ainda na faculdade. Consiste na instalação de ecobarreiras em pontos estratégicos do estuário santista para reter o lixo de grande porte, como as garrafas PET, evitando que chegue ao mar.


O projeto prevê a instalação de um galpão para reciclagem do material represado. O galpão depende da cessão, por parte da Prefeitura, de uma área no São Manoel, à beira do Rio São Jorge, onde outrora haviam palafitas. Nessa área também haverá a recuperação de vegetação do manguezal.


O financiamento do galpão, bem como das ecobarreiras, será pela iniciativa privada. “É um projeto tripartite e envolveremos a comunidade na reciclagem e na conscientização”, afirma Schepis. Ele estima que cerca de 20 toneladas de resíduos sólidos sejam coletadas por mês com as ecobarreiras. Consultada, a Prefeitura de Santos afirma que o projeto está em análise.


Discussão


O Lide Baixada Santista, que reúne lideranças empresariais e da sociedade civil da região, deve se reunir em agosto para começar a discutir um projeto de limpeza do estuário santista até 2040, informa o presidente do Instituto Ecofaxina, William Rodriguez Schepis. 
 


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