O senso do incômodo

Ao não seguirmos o caminho odiável dessa falta de senso de incomodo, tornamo-nos mais queridos, melhor compreendidos

Por: Luiz Alca  -  17/01/21  -  14:25
  Foto: Imagem ilustrativa/Unsplash

A cada dia observo, não sem certa angústia por tamanho individualismo, o quanto um número recorde de pessoas não consegue ter o senso comum do incômodo, de como atrapalham os outros nesse egoísmo exacerbado que os domina ou pensando apenas com o próprio umbigo na hora de buscar uma vantagem pessoal.


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A falta desse senso de incômodo, um comportamento tão importante de ser desenvolvido e que comporta ajudas e chamados, sim, de parceiros, pais, professores e amigos, não só gera dificuldades imensas no convívio e na cena comunitária como torna os portadores dessa falta, pessoas extremamente desagradáveis, invasivas, espaçosas e muito chatas de se estar próximo.

O pior é que elas nem percebem o que está acontecendo em sua atitude permanente de não conseguir enxergar nada que está à volta e que não diga respeito direto a algum interesse seu. Como estacionar em fila dupla ou no meio de uma rua movimentada num horário terrível e sequer desconfiar porque os outros motoristas passam e lhes olham querendo jogar o carro em cima! Como a dondoca que entra no estacionamento cheio e só porque está atrasada para a aula na academia ao lado, larga o automóvel à entrada e de porta aberta e nem se toca o que isso está causando em outros usuários: afinal, ela está pagando e o problema é do funcionário.

Há os que chegam ao posto de gasolina para abastecer e sequer se preocupam em dar espaço para outros clientes que estão entrando; ora, o frentista que se vire! E aqueles que no saguão do aeroporto ocupam uma cadeira só para a valise, sem dar a mínima para as pessoas que estão de pé, talvez, já cansadas da demora em chamar para o vôo? Será que eles percebem o que estão fazendo, ou melhor, não fazendo?

Registre-se também quem seja incapaz de oferecer a cadeira vazia de sua mesa, num barzinho ou num restaurante lotados, a não ser quando o garção vem pedir delicadamente. E muitas vezes, recebe a cara amarrada do cliente, que se acha invadido. Ah, esquecemos de citar os que estacionam em duas vagas ao invés de pensar que outra pessoa poderia aproveitar aquele espaço e então, fazer o pequeno sacrifício de uma baliza.

E os que filam consultas do médico ou do advogado, na praia, no banco, num encontro social? Sem o menor escrúpulo ou vergonha, achando que tudo é de graça e não percebendo que se trata de seu caminho profissional? É o fim. Logo, quem tem esse senso acaba despendendo algum esforço, sem dúvida, mas vale tanto a pena que o preço do transtorno é muito barato. É bem capaz de ser julgado um ET, mas não faz diferença, ou melhor, age no bom sentido, aquele que, sem criticas e humildade faz pensar "que bom que não sou assim".

Ao não seguirmos o caminho odiável dessa falta de senso de incômodo, tornamo-nos mais queridos, melhor compreendidos, vistos com simpatia. E principalmente, aceitos, o que a melhor coisa do mundo quando entendemos que ninguém vive sozinho ou apenas em torno de seu mundinho pessoal.

PS: Esta crônica foi escrita em 2008. Volta-se a ela porque nesta semana, alguém que incomodou muito com uma solicitação profissional, surpreendeu-se, chegando à grosseria, por lhe ter sido dado um preço pelo serviço. Como se todos tivessem que trabalhar de graça...


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