Carpe Diem

Aproveitar o dia é captar um pequeno gesto, uma palavra, é saber admirar uma cena linda que surge à frente numa hora, é valorizar as trivialidades, é ter a sabedoria de tirar do dia-a-dia existencial o melhor possível

Por: Luiz Alca  -  06/09/20  -  12:35
  Foto: Imagem ilustrativa/Unsplash

O apelo do poeta latino Horácio, século I AC, o “Carpe Diem” (Aproveite o Dia), cantado e decantado num filme lírico “Sociedade dos Poetas Mortos”, é lindo e importante embora esteja muito difícil de ser posto em prática no cenário utilitarista que vivemos hoje, onde a diversão se confunde com gozo obrigatório e medido e os efêmeros e deliciosos prazeres da existência humana não são assim reconhecidos por falta de sutileza e observação.


Por outro lado, tudo tem uma escala, uma ordem, um princípio, regras e mais regras, o que tira muito a leveza cotidiana. Vivemos rodeados de mestres a nos ensinar o certo e o errado, o que faz bem ou faz mal e como devemos agir nesta ou naquela situação. Isso pesa demais!


Principalmente com o correr dos anos, quando tudo passa a ser policiado, determinado, influenciando pelo medo e pela ameaça. Conheço idosos que se tornaram chatos porque só falam em doenças e nos conselhos que receberam de médicos e ditas autoridades. E assim, se esquecem de viver e curtir as coisas boas. Gostaria de passar-lhes a frase de Ronsard, um poeta francês do século 16 “Vive sem esperar pelo dia que vem, colhe hoje, desde já as rosas da vida”.


Aproveitar o dia é captar um pequeno gesto, uma palavra, é saber admirar uma cena linda que surge à frente numa hora, é valorizar as trivialidades, é ter a sabedoria de tirar do dia-a-dia existencial o melhor possível sem se perder no desagradável, no pesado, no prosaico, que tudo diminui e rebaixa.


Uma das nossas inabilidades mais claras, na tentativa de criar uma simplicidade de olhar as coisas é desconsiderar a beleza do trivial, que pode sair do prosaísmo e do rotineiro, quando os pequenos prazeres se tornam presentes para o presente.


Aquele cara que os antigos chamavam de “bon vivant” e que se afigurava como boêmio e inconseqüente, é, verdadeiramente, o que sabe tornar especial, momentos cotidianos, desde que não se mate o sentido do eterno, fazendo-o fascínio e não pavor. Minha querida amiga, a velhinha das maçãs, sempre presente em minha vida e minha obra como fonte inspiradora sempre me disse “quando percebemos que tudo morre ou sucumbe, é preciso perguntar a nós mesmos o que realmente é eterno. Os nossos questionamentos mais profundos são como leões ferozes embora leais guardando um tesouro precioso”.


Não sabem aproveitar o dia, os amargurados, aqueles que formam valores e princípios discutíveis sobre mágoas antigas ou sobre o mal resolvido, fazem questão de preservar rancores como armas e assim de nada se livram. Também não sabem aproveitar, os que têm obsessão por modelos de perfeição ou se prendem a metas inatingíveis, os que mergulham na indústria das soluções prontas, os competitivos (oh, comportamento medíocre e atrasado) e os que passam o tempo, fazendo comparações.


Aproveitar o dia! Que inteligência, meu Deus! Na visão do mestre Vinicius de Moraes é viver cada segundo como nunca mais.


Carpe Diem para vocês na leitura desta revista.


*Texto publicado em 29/8/2015, na revista Luiz Alca Crônicas, página 14


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