Empatia e liberdade para além da prisão

Instituto Ação pela Paz é indutor de políticas que mobilizem poder público e sociedade civil em torno da recuperação de encarcerados

Por: Da Redação  -  31/05/20  -  21:25
Visitas nas unidades prisionais paulistas estão suspensas desde o dia 20 de março
Visitas nas unidades prisionais paulistas estão suspensas desde o dia 20 de março   Foto: Imagem ilustrativa/Adobestock

Um termo muito usado nos últimos tempos é empatia. Aprender a olhar, se colocar no lugar do outro. E essa percepção de que uma sociedade menos violenta é boa para todos norteia o trabalho do Instituto Ação pela Paz. Trata-se de um indutor de políticas que engajem a sociedade e o poder público em torno da recuperação de presos. 


“Sempre pensei que pessoas presas são como a gente. Achava o tratamento que se dava aos presos semelhante aos campos de concentração. Já basta o castigo de estarem presos. Há cinco anos, surgiu a possibilidade de focar no sistema prisional, de forma a diminuir o nível de reincidência. Porque afeta a todos nós. A violência afeta a todos nós”, resume Jayme Garfinkel, diretor-presidente do Ação pela Paz. 


O último relatório de atividades do Instituto, de 2019, demonstra alguns bons resultados do trabalho desenvolvido. Foi verificado aumento de 272% da quantidade de projetos apoiados com relação ao ano anterior, passando para um total de 67 e com investimento de R$ 635.176,00. Além disso, 156 pessoas egressas geraram renda por meio dos projetos Recomeçar e Responsa.


“O instituto não é o fazedor. É a chama. Chegamos no Estado, poder público ou sociedade civil e fazemos três perguntas. O que vocês fazem para recuperar esse preso? O que gostariam de fazer? E o que precisam para isso? Essas perguntas é que transformam as coisas porque, em geral, eles já sabem tudo o que precisa ser feito: investir mais na educação, no trabalho, na qualificação profissional... Somos os viabilizadores disso”, reforça Solange Rosalem Senese, diretora executiva do Instituto. 


Um verdadeiro porto seguro


Jayme Garfinkel comandou, por mais de quatro décadas, a Porto Seguro, uma das líderes no setor de seguros no País. Foi tempo suficiente para compreender que o cuidado com o próximo faz toda a diferença. É algo que também vale para as empresas. 


“Dirigi uma empresa por quase 50 anos, e ela não foi sempre forte. Já foi pequenina e frágil. Então, eu compreendo e sinto o drama de quem tá vivendo agora o problema de subsistência, de sobrevivência das empresas. Tem a frase do Bill Gates: ‘O que fizermos agora definirá o que seremos para o futuro das nossas vidas’. Não é pelo fato de estarmos bem que devemos esquecer quem não está”, ensina. 


A empatia também se faz presente na confecção de 160 mil máscaras, doadas ao Governo do Estado. É mais uma oportunidade de fazer os presos entenderem que têm um papel importante na sociedade. 


“Fazemos isso com carinho, com responsabilidade. Não ‘passamos a mão na cabeça’ de bandido. Nosso olhar é para a emancipação, a autorresponsabilidade pelos atos, do quanto essa pessoa atrapalhou a sociedade com seu ato, mas também o quanto ele tem que ter uma oportunidade. A chance honesta termina no trabalho, no emprego. Levar as coisas com seriedade e eles terem essa percepção. Precisamos envolver o máximo de pessoas. Os próprios presídios podem mostrar para sociedade o quanto ela pode se transformar”, explica Solange. 


Um tanto avesso à publicidade dos atos de benemerência, Garfinkel se justifica. 


“Sou muito cuidadoso na questão de comunicar o que a empresa está fazendo em termos de responsabilidade social e filantropia. Porque você não está ligando sua marca a alguma coisa simpática. Está fazendo porque deve ser feito. Para mim, é um princípio ético não falar o que estou fazendo. Mas eu quero fazer”. 


Recomeçar, uma palavra de ordem e um novo sentido para a vida


Quem nunca caiu e ensaiou uma retomada na vida? Pois recomeçar é um verbo imprescindível para todos. Pois o projeto que carrega essa palavra no nome e no sentimento tem motivos para comemorar. Ele é um dos parceiros do Instituto Ação pela Paz. 


Leonardo deixou o sistema prisional e lidera o Projeto Recomeçar
Leonardo deixou o sistema prisional e lidera o Projeto Recomeçar   Foto: Divulgação

O Recomeçar deu início em suas operações em 2015 dentro das repartições do Instituto Gerando Falcões com a responsabilidade de dar amparo moral e social para egressos do sistema carcerário.


Instalado na cidade de Poá (SP), tem cerca de 1.200 pessoas cadastradas e uma estrutura apta para o trabalho cm o atendimento e desenvolvimento social dessas pessoas. 


“O Instituto Ação pela Paz foi o nosso divisor de águas, com financiamento e pontes (conexões) entre o setor privado e áreas governamentais para que possamos desenvolver o nosso trabalho em modelo de rede. O Recomeçar é um benefício para a sociedade, pois trabalhamos no tratamento social de pessoas que viveram ou vivem anos no mundo da criminalidade”, aponta Leonardo Precioso, responsável pelo projeto. 


Sentindo na pele


Aos 26 anos, Léo foi recolhido pelo sistema penitenciário, onde permaneceu sete anos e 13 dias encarcerado. Gestor do Programa Recomeçar, ele trocou o crime pelo trabalho social no extremo leste de São Paulo, ele retomou seus estudos e cursa educação física. Em 2016, Leo ganhou o Prêmio Jovem Brasileiro, na categoria Social, se tornando o primeiro ex-presidiário da história a ganhar esse prêmio.


“Tem uma coisa que é legal: programas que são geridos por pessoas egressas. Percebemos que o egresso prisional fala para o coração de outro egresso. E aí as coisas funcionam melhor”, lembra Solange. 


“Às vezes, fazemos café da manhã com empresários, para motivá-los a contratar também. Mas a gente sabe o quanto é difícil: às vezes o egresso não tem uma postura adequada. São coisas que têm que ser superadas. Esses dois programas são destinados ao aprimoramento dessas pessoas”, reforça ela. 


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