Reserva do Santos nos anos 60, Maneco foi um xerife no time do Rei Pelé

Ex-zagueiro foi campeão de tudo ao lado de Pelé e outros craques do Peixe

Por: Régis Querino  -  24/02/20  -  18:33
Privilegiado, Maneco relembrou passagens com a dupla Coutinho e Pelé
Privilegiado, Maneco relembrou passagens com a dupla Coutinho e Pelé   Foto: Matheus Tagé/AT

Era uma noite quente no início da década de 1960. Manoel André Avelino Júnior tomava um chope no Nicanor, na Rua Amador Bueno, no Centro, quando o amigo que lhe acompanhava o chamou para assistir ao treino do Santos. Mal sabia o garoto de 20 anos que aquela ida à Vila Belmiro mudaria a sua vida.


"Faltou um jogador no treino e o Vasconcelos, que jogou no Santos, me apresentou para o Lula. O técnico disse que sabia que eu era volante, mas precisava de um quarto zagueiro e perguntou se dava para eu quebrar um galho. 'Pô, no Santos jogo até no gol [risos]'", cravou Maneco. 


O apelido ele já carregava desde os tempos em que jogara na base do Jabaquara, dos 14 aos 17 anos. Vestiu também a camisa da Portuguesa Santista, aos 19, antes de estar, naquela noite quente, no lugar certo, na hora certa.


"Acabou o treino e eu tava tomando banho no vestiário quando o Lula chegou e disse: ‘Você quer ficar no Santos?’ Perguntei se ele tava brincando. 'Não, pega os seus documentos, traz amanhã e você fica com a gente. Fui contratado no chuveiro [risos]".


Foram quatro anos no Alvinegro de Pelé e companhia, um privilégio e orgulho que nem todos podem ter. Reserva de Calvet, Maneco não figurava com frequência no time titular, mas isso não foi problema para a sua carreira. 


"Ser reserva daquele time era melhor do que ser titular de qualquer outro. Foi bom porque fiz uma carreira no Santos, mesmo como reserva, e depois que saí joguei em seis clubes. Chegava como titular e ganhando mais do que os outros, só por ter jogado no Santos".


Formar naquele esquadrão dos anos de 1960, mesmo no banco, lhe garantiu todos os títulos possíveis, inclusive o bicampeonato mundial em 1962/63.


Jogo especial


Em sua trajetória, Maneco guarda até hoje um jogo na memória. A goleada de 6 a 2 sobre o São Paulo, pelo Torneio Rio-São Paulo de 1963, no Pacaembu - maior placar já conquistado pelo Alvinegro contra o rival. 


"O Santos fez 2 a 0, mas o São Paulo empatou e cresceu com a torcida. Logo depois, o Calvet levantou o braço pedindo substituição. O Lula só bateu na minha perna: 'Vai'. Era garoto, minha cabeça foi a mil, mas como o Santos era o Santos, fez 6 a 2. Ficou na história".


No mesmo ano, Maneco viveu seu maior dissabor com a camisa santista. Curiosamente, com uma vitória. "Jogamos contra o Jabaquara na Vila e se o Jabuca ganhasse, ficaria na primeira divisão. Se perdesse, cairia. Ganhamos [5 x 3] e fiquei triste, sempre gostei do Jabaquara".


Quando deixou o Alvinegro, Maneco desfilou a sua categoria no Taubaté, Noroeste, Ferroviária, Saad, Quilmes (Argentina) e Portuguesa de Desportos, seu último clube, então treinado por Lula. "Encerrei a carreira jogando com o Coutinho e o Geraldino, ex-companheiros de Santos".


Realizado em campo, fora dele, dizem, Maneco também fazia sucesso com as mulheres. "Tinha essa estória, mas é propaganda enganosa [risos]. Pior que uma vez o Milton Neves disse que eu era BBB, Boemia, Boa Vida e Brahma, e quando teve o cruzeiro dos 100 anos do Santos, minha mulher, brava, foi falar com ele", diverte-se.


Zagueiro fez participação em filme


Privilegiado, Maneco relembrou passagens com a dupla Coutinho e Pelé. Sobre o camisa 10 mais famoso de todos os tempos, ele recordou que fez uma ponta no filme Rei Pelé. Em uma cena, o craque carregaria a bola, driblaria o zagueiro e faria o gol. 


"O diretor veio falando como tinha que ser. 'Quando ele [Pelé] vier, você dá um carrinho pra direita e ele vai pra esquerda'. Aí eu disse pra ele: ‘Deixa ele vir com a bola, porque de qualquer jeito ele vai me driblar, vai ficar mais original. Você vai fazer eu cair, passar esse vexame? [risos]".


Acostumado a marcar (ou melhor, tentar marcar) Pelé nos treinos, Maneco disse que chegou a perder três quilos em um treinamento. "Um calor de 40°C e eu correndo atrás do negão. Não era brincadeira. Ele saía assobiando e eu ficava morto [risos]".


Em outra filmagem, desta vez para uma emissora de TV alemã, Pelé pediu para Maneco sair de lado quando o escanteio fosse batido, porque ele daria uma bicicleta.


"Escanteio batido, ele deu a bicicleta e... gol. Acabou a filmagem e, sem nada combinado, caiu uma bola e ele, pum, outra bicicleta e gol. 'Pô negão, essa não tava combinada!', disse pra ele. A dupla Pelé e Coutinho era um negócio fora de série".


Coutinho


Sobre o genial e genioso atacante, Maneco lembrou que, certa vez, o time estava concentrado e Coutinho, às vésperas do casamento, o chamou para ir a um alfaiate em São Vicente. 


"Na volta, ele me levou pra conhecer o apartamento que tinha comprado na Avenida Conselheiro Nébias [em Santos]. O Coutinho sempre gostou de uma cervejinha e eu também [risos], mas à noite tinha jogo com o Botafogo, do Garrincha e Nilton Santos, no Pacaembu. Era uma da tarde. 'Mas vai ter jogo', falei. E o Coutinho: 'Você não vai jogar, quem vai jogar é o Calvet'. 'Então abre [a cerveja]', eu disse. Tomamos umas três e fomos pra concentração. Adivinha quanto foi? 4 a 2 pra gente".


Logo A Tribuna
Newsletter