Seleção, Santos e Neymar: Canhão da Vila, Pepe comenta sobre assuntos do futebol

Ex-jogador do Peixe e da seleção brasileira recebeu homenagem da federação sueca de futebol em novembro

Por: Régis Querino  -  25/11/18  -  18:00

Esbanjando vitalidade aos 83 anos, José Macia, o eterno Pepe, ganhou este mês mais uma homenagem. Foi até Estocolmo, na Suécia, terra do primeiro título mundial da Seleção Brasileira, em 1958, para ser condecorado como Membro Honorário Vitalício da Associação Sueca de Futebol. Com o alto astral que lhe é peculiar, o Canhão da Vila recebeu a Reportagem de A Tribuna em sua residência, em Santos, para falar da honraria concedida pelos suecos. E, claro, do Santos, da Seleção (de ontem e de hoje) e,ainda, relembrar momentos marcantes de sua vida e sua carreira.


Homenagens, Seleção, Santos e Neymar: Pepe comenta sobre futebol
Homenagens, Seleção, Santos e Neymar: Pepe comenta sobre futebol   Foto: Vanessa Rodrigues/AT

Como foi receber o prêmio?


Eu recebi emocionado, afinal de contas são 60anos. Tivemos um reconhecimento muito grande por parte da imprensa sueca, dos torcedores. Encontrei o Cabralzinho, ex-jogador do Santos, grande amigo meu, que está morando na Suécia. Valeu a pena, porque a gente relembra os momentos felizes, quando fomos campeões perante um povo maravilhoso, que respeitou o Brasil e aplaudiu a Seleção. Mexeu na memória e no coração.


Como foi o reencontro com os jogadores suecos?


O capitão deles disse que somente quatro suecos estão vivos e dos brasileiros, seis. ‘Até nisso vocês ganham da gente’, disse ele,muito espirituoso.


Quais as lembranças daquela Copa?


Infelizmente não pude jogar. Antes de chegar na Suécia, fizemos dois jogos na Itália. Ganhamos de 4 a 0 da Fiorentina, fiz um gol, era titular. No segundo jogo estávamos ganhando da Inter de Milão, também por 4 a 0, e o Bicicli me deu um toque por trás no tornozelo direito. Me tirou do jogo e da Copa. Cheguei na Suécia com o pé direito de chinelo e o esquerdo de sapato. No quarto jogo eu tinha possibilidade de jogar, mas o treinador, o Vicente Feola, e o Paulo Machado de Carvalho (chefe da delegação) julgaram que era melhor eu não jogar. Primeiro porque o Zagallo estava cumprindo o papel dele, e segundo é que não havia troca. Se entrasse e me machucasse, o time ficaria com 10.


O que mudou com o título?


A valorização do futebol brasileiro começou depois de 1958. Chegamos da Suécia e, 15 dias depois, estávamos em Bauru, Piracicaba jogando o Paulista. E a propaganda era: o Santos vem com Zito, Pelé e Pepe. Todo mundo queria ver os campeões mundiais. A conquista também acabou com o trauma de 1950.


O que você lembra daquela derrota?


Eu tinha 15 anos, meu pai tinha um bar em São Vicente e as pessoas iam ouvir os jogos da Seleção em um rádio grandão que ele tinha. Nesse dia, de Brasil e Uruguai, eu estava jogando bola no campo do areião ,na Vila Melo. Aí alguém falou: ‘o Brasil tá ganhando de 1 a 0, gol de Friaça’. Daqui a pouco: ‘Schiaffino empatou’. Quando acabou o jogo, meu irmão falou: ‘Pepe, o Ghiggia marcou e o Uruguai foi campeão’. Aí desabou o mundo, foi a primeira grande decepção que eu tive com o futebol.


E a Copa de 1962?


Eu, que me machucava tão pouco no Santos, me machuquei outra vez. Chegaram a dizer: ‘o Pepe não tem espírito de Seleção’. Uma ova! Eu tinha muito espírito de Seleção, joguei 40 jogos na Seleção, marquei 21 gols. Marquei gol em Wembley, no Gordon Banks cobrando falta, e vários gols decisivos, mas quando eu mais queria, na Copa, tive essa frustração. Fui bicampeão mundial, mas com essa decepção. Por isso que sempre digo que me fez um bem incrível quando o Santos foi bicampeão mundial.


A Fifa reconheceu esta semana o Corinthians como único bicampeão mundial fora da Europa. O que acha disso?


O cara que fez essa lei aí nunca colocou uma chuteira, um calção, nem deu chute numa bola, e é responsável por fazer uma arbitrariedade dessas. O Santos é bicampeão mundial dentro de campo,jogando.


Como você viu o fracasso da Seleção na Rússia?


Eu sabia que a Seleção que foi à Copa tinha qualidade, mas extremamente dependente do Neymar. Na nossa época, não é crítica aos jogadores brasileiros de hoje, mas a gente sentia na pele quando perdia um jogo. Agora não. Os jogadores podem até sentir, mas vão para a Europa, China, onde eles jogam. Antigamente era um grupo todo aqui do futebol brasileiro, as bordoadas da imprensa atingiam a gente.


Você acha justas as críticas feitas ao Neymar?


O Neymar é fera desde que jogava no infantil do Santos, é um cara predestinado a jogar futebol. Ele está recebendo no campo o preço da fama, de ser considerado um dos melhores do mundo, sofre uma marcação incrível. Mas é um cara de personalidade e eu acredito numa recuperação dele.


Acha que foi um erro ele sair do Barcelona para o PSG?


Não vou dizer que é um erro, não estão vendo a parte financeira. Mas o Barcelona é muito mais vistoso (risos),todo mundo quer ver o Barcelona.


Manter o Tite na Seleção foi uma decisão acertada?


Vejo qualidades no Tite, é bom treinador. Vejo também pelo ambiente, é bom, de disciplina, respeito. Erra aqui, erra ali, mas é um técnico honesto.


E o Santos? Sofreu muito nesta reta final do Brasileiro?


O jogo da Chapecoense (derrota por 1 a 0 no Pacaembu) complicou a trajetória do Santos. Apesar de ter alguns jogadores experientes, é um time muito jovem. O treinador é de qualidade, eu conheço, inteligente. O Santos tem dado oportunidades a jovens e a maioria está dando certo, tem futuro, é questão de tempo. O Cuca anunciou a saída após o Brasileirão, pois está com um problema cardíaco. Um conselho que dou a ele: deixe de lado o futebol por algum tempo. Em primeiro lugar, a saúde e a família.


Foram quantos anos como técnico?


Eu parei de jogar em 1969 e me tornei treinador da base do Santos. Cheguei a trabalhar no Japão e, em 2004, no Al Ahli, do Catar, com o Abedi Pelé, o melhor africano de todos os tempos, e onde tive o prazer de ser técnico do Guardiola. Ele é inteligente, diz que aprendeu a cabecear comigo. Torço pra ele, a não ser que jogue como Santos (risos).


É muito mais difícil ser técnico do que jogador, não?


Como jogador você faz a sua parte, às vezes até perde o jogo, mas faz um gol. O treinador sabe que fez a coisa certa, o time não deu a resposta, perdeu e ele é o culpado, é burro. Falei pra Gisa (filha) outro dia: às vezes sonho que estou jogando, mas nunca que estou sentado no banco de treinador. Aquilo é uma cadeira elétrica (risos).


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