A prisão domiciliar para devedores de pensão alimentícia, recomendada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) durante a pandemia, não é punição eficaz no momento, já que a maioria da população já está em isolamento em casa por causa do coronavírus. Como esse argumento, a juíza Thatyana Antonelli, da 1ª Vara da Família e Sucessões de Santos, decretou a ordem de prisão de um pai inadimplente para ser cumprida assim que a quarentena acabar.
"A prisão domiciliar do devedor de alimentos, como meio coercitivo ao pagamento, não me parece meio coercitivo hábil ao propósito a que se destina, posto que a adoção da medida retira o caráter sancionador previsto pela norma, cujo objetivo é inibir o injustificável descumprimento da obrigação de alimentos. Com efeito, a maioria da população já está em regime de isolamento domiciliar por conta da pandemia e, assim, não há razoabilidade em que o devedor de alimentos faça uso de tal tempo de isolamento geral para cumprir a prisão civil que lhe fora imposta”, disse a magistrada na decisão, em 11 de maio.
O caso se refere a ação movida por uma moradora do Embaré, em Santos. A mulher, de 34 anos, está desempregada e tem um filho de 2 anos. O pai não paga integralmente a pensão desde junho de 2019, totalizando o débito de R$ 30,9 mil. A advogada Carol Valentino Restituti, do escritório Brunno Brandi Advogados, representa mãe e filho. Ela afirma que a decisão alcançou o objetivo esperado.
“A juíza compreendeu que a decretação da prisão domiciliar no atual cenário não teria nenhuma mudança prática na vida do devedor. A decisão é importante, pois garante à mãe e ao filho que, após finalizado o período de quarentena, o devedor de alimentos será realmente preso”, explica a advogada.
Segundo Carol, a ordem judicial deve ser cumprida assim que acabar a quarentena, sem necessidade de nova intimação ou qualquer ato que dependa do andamento processual, que muitas vezes é lento.
Desemprego não justifica
A advogada Marcela Menezes, do escritório Posocco & Associados, explica que a jurisprudência dominante traz o entendimento de que desemprego não é requisito para deixar de pagar a pensão alimentícia. O isolamento social por conta das medidas preventivas ao coronavírus também não justifica.
“Para os casos em que for comprovado que a renda ficou prejudicada, a melhor alternativa seria a realização de acordo extrajudicial entre as partes, devidamente acompanhadas por seus advogados, com o intuito de equacionar algumas despesas não essenciais”, diz Marcela.
Segundo a advogada, o devedor pode ainda ingressar com ação revisional de alimentos, demonstrando, por meio de documentos (extratos financeiros, demissão, contrato de rescisão sua ou de seus empregados), as dificuldades financeiras. “Não é possível apenas deixar de pagar a pensão, isso depende de decisão judicial e não de mera liberalidade”.
Para ela, a decisão da juíza Thatyana Antonelli é acertada, já que se fosse decretada a prisão imediata, o pai poderia pedir a suspensão, considerando o risco de disseminação da Covid-19.
Sem efeito
O advogado Matheus Cury acredita que a prisão no atual cenário não surtiria o efeito pedagógico necessário. “A prisão civil tem prazo determinado. Se decretada nesse momento, ainda que domiciliar, conta -se o prazo de igual forma que contaria se decretada a comum”.