Câmara de Santos aprova projeto que disciplina tempo de espera na balsa

Propositura foi aprovada em primeira discussão; sessão foi marcada por ataques ao governador, ao PSDB e à Dersa

Por: De A Tribuna On-line  -  27/04/19  -  11:15
Travessia foi comprometida por temporal que atingiu a Baixada Santista na tarde de sexta-feira
Travessia foi comprometida por temporal que atingiu a Baixada Santista na tarde de sexta-feira   Foto: Rogério Soares/AT

A Câmara de Santos aprovou em primeira discussão, na última quinta-feira (25), o Projeto de Lei 19/2019, de autoria do vereador Antonio Carlos Banha Joaquim (MDB), que disciplina o tempo de espera e o monitoramento dos serviços de travessia de veículos nas balsas no município. A propositura ainda precisa passar por uma segunda discussão antes de seguir para sanção ou veto do prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB).


O debate sobre o texto do PL foi ditado por críticas à Dersa, estatal responsável pelo sistema de travessias, ao governador João Doria e ao PSDB, que comanda o Executivo estadual há 24 anos.


Autor do projeto, Banha fez duras críticas ao serviço prestado pela companhia. "Há mais de 22 anos que aqui estou. São incontáveis os processos jurídicos, ações civis públicas, até atos que esbarram na incompetência, na falta de qualidade e no péssimo serviço realizado", disse o vereador.


O emedebista lembrou que a busca pela melhora no serviço de travessias entre Santos e Guarujá é uma luta que foi encampada, também, a nível estadual e federal, por personagens como Maria Lúcia Prandi, Mariangela Duarte e  Telma de Souza. 


A propositura recebeu parecer contrário da Diretoria Jurídica do Legislativo santista. No documento, foi colocado que "a competência para legislar a propósito da prestação de serviços públicos de transporte intermunicipal é dos estados-membros". Ou seja, uma lei como esta só poderia prosperar em legislação estadual, sendo vedada essa prerrogativa ao município.


No entanto, o parlamentar analisa de outra forma. "A travessia é da Dersa. Eu pago uma tarifa à Dersa. A partir do momento que eu pago uma tarifa à Dersa, é uma prestação de serviço. Muitas vezes, o Supremo Tribunal Federal fala sobre a Constituição. Tudo é imoral, ilegal ou engorda. É inconstitucional. O artigo 30 da Constituição diz que compete aos municípios legislar sobre assuntos de interesse local", analisou Banha.


O vereador ainda comentou os problemas enfrentados na travessia de barcas entre Santos e o Distrito de Vicente de Carvalho, em Guarujá, ao dizer que, se não fossem os catraieiros, o caos estaria instalado na região. Além disso, ele classificou a ligação seca entre os municípios como uma lenda urbana.


Já Rui de Rosis (MDB) apontou suas críticas diretamente ao PSDB. Segundo ele, a gestão social-democrata, que há 24 anos governa o Estado de São Paulo, mente constantemente aos munícipes da Baixada Santista.


"Infelizmente, o PSDB, que governa há mais de 20 anos o Estado de São Paulo, sempre trouxe para nós mentiras seguidas de mentiras. E nós, como bons santistas, como povo acolhedor, acreditamos que isso poderia acontecer um dia. Mas, jamais isso aconteceu. E continuam insistindo na mentira. É mentira do governador quando diz que fará a ponte. Não acredito em hipótese alguma que isso seja verdade. Ele diz que vai terceirizar, que vai fazer a ponte, vai comprar os motores e vai privatizar a Dersa. Não é verdade. Não é possível que nós santistas, os turistas que nos visitam e que os amigos de Guarujá passem por esse sofrimento que vivemos há tantos e tantos anos. Não há condições mais de continuarmos acreditando", falou o parlamentar.


O presidente da Câmara defendeu a adoção de um radicalismo por parte do Poder Público municipal, como o fechamento do caminho para o atracadouro da Dersa, na Ponta da Praia. "Fecha um dia só para ver se, no dia seguinte, eles não colocam 20 balsas para operar por aqui", comentou o vereador.


Geonísio Aguiar, o Boquinha (PSDB), também adotou um tom crítico contra a Dersa, ao afirmar que a empresa existe "só para tomar dinheiro". Ele também lembrou que Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, é ex-diretor da estatal e está envolvido em casos de corrupção dentro do Governo do Estado.


O tucano encampou a sugestão de Rui de Rosis ao propor o fechamento, por um dia, da entrada para o atracadouro da balsa em Santos, e pediu um maior comprometimento de todos os deputados estaduais em relação aos problemas enfrentados naquela região.


Reforço junto à Assembleia Legislativa


Telma de Souza (PT) ressaltou que, assim como foi dito no parecer jurídico da Câmara, o projeto deveria ser aprovado por legislação estadual. No entanto, destacou que era necessária a aprovação do projeto para forçar o estado a desenvolver a propositura a nível estadual. "A Dersa vai dizer que é um projeto inconstitucional. Nós temos que fazer pressão para que isso deixe de acontecer", disse a petista.


A vereadora disse que já havia apresentado um texto, enquanto deputada estadual, em 2011. Segundo ela, o deputado Tenente Coimbra (PSL) se prontificou a dar prosseguimento a essa iniciativa. 


"Temos que dar força ao projeto, que já foi aceito pelo vereador Edilson [Dias, do PT], do lado de Guarujá. Fazer esforços junto ao Tenente Coimbra para que possamos ter uma aprovação em nível estadual, que é o lugar correto, porque é uma lei estadual, para fazermos essa votação", comentou Telma, lembrando que o projeto já foi aprovado na cidade vizinha.


Sadao Nakai (PSDB), que preside uma Comissão Especial de Vereadores (CEV) que aborda questões relacionadas à travessia de balsas entre Santos e Guarujá, reforçou o pedido de Telma por uma ação política neste sentido. Ele sugeriu que Tenente Coimbra una forças, também, com o deputado estadual Paulo Corrêa Jr. (Patriota), que preside uma Frente Parlamentar para tratar do tema.


"Se a gente for esperar o Governo do Estado criar uma normatização, vamos ficar esperando mais uns 20 ou 30 anos", avaliou o tucano, que ainda destacou que a aprovação do projeto de lei não iria prejudicar os cofres da prefeitura, uma vez que já existe um convênio entre a administração municipal e a Dersa para que a fiscalização na fila de espera das balsas tenha o auxílio de agentes de trânsito da Companhia de Engenharia de Tráfego de Santos (CET-Santos) e de guardas municipais.


Ataques ao governador João Doria


Alguns vereadores realizaram ataques diretos ao governador João Doria (PSDB). Lincoln Reis (PR) disse que a época da eleição já passou, e que o chefe do Executivo estadual deveria deixar o revanchismo de lado - o prefeito Paulo Alexandre Barbosa apoiou a eleição do vice-governador da gestão Geraldo Alckmin (PSDB), Marcio França (PSB).


Segundo Reis, "não existe mais partido" após as eleições, e a população não pode ficar sofrendo. Ele ainda destacou que a travessia de barcas entre Santos e Vicente de Carvalho operou, na última quinta-feira, com apenas uma embarcação, e em tom sarcástico sugeriu que o presidente da categoria dos catraieiros assumisse a gestão da Dersa.


Defensor solitário de Doria no plenário da Câmara de Santos durante a sessão, Augusto Duarte (PSDB) disse manter a confiança na gestão do tucano à frente do estado.


"O tempo será a resposta para muitos dos senhores. Quem está vivendo e conhece um pouco do estado sabe que o governador o assumiu com um plano de austeridade. Você não vê os gestores, da Agem, da Sabesp, sendo nomeados. Ele está fazendo um contingenciamento de recursos, porque é necessário”, disse Duarte.


O parlamentar informou que, segundo o secretário de Desenvolvimento Regional, Marco Vinholi, a Dersa e a CDHU serão extintas. O vereador santista ainda ressaltou que o governador tem a "ambição de construir a ponte seca", e que a "Cetesb já tem o pedido de alvará para início do projeto".  


Duarte falou que é importante a aprovação do projeto de lei de autoria de Banha, mas voltou a elogiar Doria ao dizer que o governador prepara algo revolucionário para o estado, e que confia que o tucano será o próximo presidente da República.


Chico Nogueira relembrou os projetos inaugurados por outros governadores, como a maquete da ponte Santos-Guarujá anunciada por José Serra (PSDB), em 2010; e o túnel Ssubmerso apresentado por Alckmin, em 2014. Nenhum deles saiu do papel.


"João Doria ganhou a eleição. Se comprometeu. Falou que é ambição. Tomara que a ambição seja para executar a obra, não de fazer projeto, gastar dinheiro. Se somar todo esse dinheiro gasto em projetos, quantas balsas não iam estar funcionando? Dinheiro jogado no lixo, dinheiro da população", analisou o petista.


Nogueira ainda levantou uma suspeita sobre a queda na qualidade do serviço prestado pela Dersa. O parlamentar insinuou que o governo estadual precarizou a travessia de balsas para facilitar a privatização do sistema.


"Quando se quer privatizar um órgão público, primeiro você sucateia. Faz com que a opinião pública fale que não presta, que não está funcionando. Depois que privatiza, não tem como voltar atrás. Aí, vem como Mariana. Privatizou, a Vale ganhou a concessão e a gente vê na televisão o que é uma empresa privada sem cuidado nenhum com o que é público, com as pessoas no entorno daquele estabelecimento. Aquelas barcas estão realmente quebradas, ou estão sucateando para privatizar?", questionou o vereador.


Líder do governo Paulo Alexandre Barbosa no Legislativo santista, Adilson Júnior (PTB) ironizou a defesa feita por Augusto Duarte. 


"Sei que ser líder, às vezes, é uma posição que exige bastante. Mas defender isso? O Augusto se superou, foi demais. O Doria tem que te ligar de novo, porque, pela tua fala, ele é bastante íntimo de Vossa Excelência. Ele deve estar mandando um WhatsApp falando 'muito obrigado, porque nem eu faria essa defesa por mim mesmo'", comentou Júnior.


O vereador cobrou maior efetividade nas ações do governador, e classificou o bordão 'Acelera' - muito utilizado pelo tucano - como uma "peça de marketing que já está caindo por terra".


"Acelera, mas põe o pé no acelerador. É o [Hospital dos] Estivadores, que fala que vai pagar e não paga. Se não fossem os deputados, o Tenente Coimbra, as pessoas, daqui a pouco não teria mais o Estivadores. Agora, ele vai privatizar o Ceasa. Ouvi ele falar, na rádio, que não poderia dizer o lugar porque era segredo. Segredo?! Agora, a balsa é um problema. Vocês acham normal um sistema que custa R$ 12 milhões por mês não funcionar?", comentou o parlamentar.


Além disso, Adilson Júnior também pediu uma ação do Ministério Público junto à questão, e disse que João Doria não tem a mínima noção do que é enfrentar as filas da balsa, uma vez que não se utiliza da travessia por possuir helicópteros e aviões para se deslocar pelo estado.


Doria x França


Augusto Duarte voltou a defender João Doria, e atacou alguns dos pares presentes à sessão, ao dizer que "boa parte ajudou na [campanha para] reeleição do governador Marcio França". O vereador disse que o pessebista passou quatro anos como vice de Alckmin e oito meses como chefe do Executivo estadual, mas que não era alvo de ataques dos parlamentares.


"Agora, com 100 dias de governo, eu vejo tecerem comentários como se o governador João Doria fosse um verdadeiro incompetente. Ele está querendo encerrar as atividades da Dersa para aplicar os recursos de forma correta, com responsabilidade", reforçou o tucano.


Benedito Furtado (PSB) rebateu a fala de Duarte ao dizer que Doria "foi execrado em São Paulo". Ele recordou que o atual governador perdeu na capital paulista para Marcio França no segundo turno das eleições de 2018.


"Perdeu a eleição lá porque não tinha palavra. Assumiu o compromisso com o povo de São Paulo de governar até o fim do mandato. Quando chegou à metade, já queria ser presidente. E, quando viu que era pequeno demais para ser presidente, resolveu concorrer ao estado. E aí, com a máquina do PSDB, com o Chico Preto [Paulo Vieira de Souza] por trás, esse povo todo... Esse cara não era Chico Preto, era Chico Verde. Aquelas notinhas, como gostava do verdinho. E eu tenho certeza que aquele verdinho foi distribuído para esse povo todo", provocou Furtado.


Na visão do pessebista, França assumiu os pepinos da gestão Alckmin por questão de lealdade. "E segurou até o fim do mandato. Injetou dinheiro na região, que depois foi retirado pelo seu governador", disse o vereador a Augusto Duarte.


Ele ainda classificou as balsas como "um problema crônico do PSDB, de seguidos governos mentirosos". Segundo Furtado, Marcio França teria deixado o projeto da ponte pronto para ser iniciado em 2019, mas as obras foram retardadas pelo atual governador. 


O projeto


A propositura foi apresentada em conjunto com o vereador guarujaense Edilson Dias (PT). No caso de Guarujá, a proposta tramitou de maneira mais rápida, tendo sido sancionada pelo petista, que é presidente do Legislativo, na última semana. O prefeito Válter Suman tem 90 dias para regularizar a lei.


Pelo texto, fica fixado como tempo máximo de espera na fila, para todas as travessias, o período máximo de 20 minutos nos pontos de acesso. Se o usuário do serviço permanecer mais do que esse tempo na fila - o período não inclui o trajeto percorrido pela embarcação na travessia entre os dois municípios -, ele deverá realizar o registro com as autoridades de trânsito presentes na fila da balsa, ficando a concessionária infratora sujeita a multa de cem vezes o valor da tarifa, ou ficará livre da autuação se isentar da tarifa o usuário que ficou acima do limite de espera na fila.


Além disso, deverão ser fixadas, em local visível, placas e luminosos informativos sobre o tempo estimado de espera para embarque e travessia, e os usuários serão monitorados pela CET até o momento em que saírem da fila ou efetuarem a travessia.


A proposta estabelece, também, que a CET-Santos deverá criar mecanismos de monitoramento e informação aos usuários sobre o período de espera para embarcar. Ainda em caso de reincidência, a concessionária do serviço poderá ser multada em mil vezes o valor da tarifa vigente, sendo o valor revertido ao Fundo Social de Solidariedade.


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