Motorista barra deficiente em Praia Grande

Ele desceu do veículo e pediu à mãe carteira para pegar o ônibus; família mora em Santos

Por: Nathália de Alcantara & Da Redação &  -  16/03/19  -  20:10
Maria Clara Lemes Cintra Baptista, de 17 anos tem deficiências múltiplas e vive com a mãe e a irmã
Maria Clara Lemes Cintra Baptista, de 17 anos tem deficiências múltiplas e vive com a mãe e a irmã

Às 22h e com a filha Maria Clara Lemes Cintra Baptista, que tem 17 anos e deficiências múltiplas, a jornalista Vanessa Lemes, de 40, teve de esperar por quase 30 minutos com a jovem e a outra filha de 9 anos na rua até ter garantido o direito à gratuidade no ônibus municipal de Praia Grande, na última quinta-feira (14).


Elas acompanharam um espetáculo de dança no Palácio das Artes, no Boqueirão, e caminharam até a Avenida Costa e Silva para pegar um ônibus até a casa da mãe de Vanessa, no Canto do Forte. O detalhe é que ela foi barrada de entrar na linha 94 com as filhas.


Segundo Vanessa, o motorista desceu do ônibus e, em vez de ajudar Maria Clara a entrar no coletivo, ele perguntou da carteirinha que garante a gratuidade.


“Minha filha tem uma deficiência perceptível. Ela não anda, não fala, ouve pouco, enxerga com dificuldade, tem autismo e epilepsia por conta de uma má formação cerebral. Ele pediu uma carteirinha e eu mostrei a da emitida em Santos, onde moramos, que não foi aceita”.


Vanessa diz que usa o transporte público desde que a filha nasceu e anda com ela para todo canto, inclusive em outros estados. Mas nunca tinha passado por uma situação como essa.


“Imagina se tivermos de andar com uma carteirinha para cada município. O pior é que eu estava com o dinheiro contado. Tinha apenas R$ 7,00 e seria uma boa caminhada até o nosso destino”.


Depois de bate-boca e Vanessa avisar que acionaria a Polícia Militar, o motorista então ligou para o seu supervisor para saber o que fazer.


Constrangimento


“Foi tudo muito constrangedor. O ônibus parado e a gente naquela situação. Algumas pessoas, indignadas, ainda tentaram pagar a passagem pra gente, mas o motorista disse que não poderia mais aceitar o dinheiro porque já tinha aberto um procedimento com a empresa”.


Se não bastasse tudo isso, um outro ônibus chegou para que as pessoas fossem transferidas para ele e seguissem viagem. “Nós seríamos deixadas pra trás. Aí, eu exigi embarcar com minhas <CW-5>filhas e o outro motorista deixou. Basta olhar para ela, não precisa ser médico ou mostrar qu</CW>alquer documento”.


A jornalista diz que a situação toda fez com que ela temesse pelos direitos das minorias. “É triste ver esse sentimento. O capital vale mais do que o ser humano. Nascer com deficiência é uma verdadeira saga. Minha filha já tem as lutas diárias dela. Passar por isso é muito exaustivo”.


Mas, questionada se pretende sair menos com Maria Clara, Vanessa não hesita em responder. “Não vou esconder minha filha em casa. Vamos sair, sim, e para fazer de tudo. É preciso enfrentar obstáculos para garantir os direitos até para as próximas gerações, pois não vai parar de nascer gente deficiente”.


Gratuidade é garantida por lei


Questionada sobre o caso, a Secretaria de Transportes de Praia Grande diz que cada município expede a carteira de gratuidade para o seu sistema e que “a BR Mobilidade é a responsável por conceder a utilizada no sistema intermunicipal”. Só que a linha reclamada era municipal. Fala, ainda, que as gratuidades estão previstas no Decreto 4154/2006 e que o caso será analisado.


Só que, segundo o advogado da área cível Pablo Carvalho Moreno, a gratuidade deveria ter sido garantida pelo motorista por conta da deficiência de Maria Clara. E esse direito é previsto nas constituições Federal e Estadual.


“Se a deficiência é permanente, como nesse caso, com a locomoção comprometida, não há motivo que justifique não conceder o direito à gratuidade a jovem e a um acompanhante, no caso a mãe. Isso além da questão do bom senso e da humanidade”. 


Humanidade


Quem concorda com ele é o jornalista especializado no universo da pessoa com deficiência e responsável pelo Blog Vencer Limites Luiz Alexandre de Souza Ventura. “Há uma questão de humanidade envolvida e de despreparo do motorista, que não foi orientado corretamente”.


Segundo ele, existe dificuldade para compreender que a pessoa com deficiência é um cidadão que pode viajar o mundo. Deveria ter uma carteirinha estadual ou federal para evitar esses absurdos diários de discriminação e preconceito. O motorista não precisa ser um robô que faz um caminho correto”.


Conhecimento


A gerente de projetos de inclusão Social e consultoria com foco na contratação de pessoas com deficiência, Mara Lígia Kiefer, lembra a importância de conhecer a legislação e estar prevenido. “Infelizmente, tem pessoas sacanas que se aproveitam. Então, é chato, é ruim, mas ter a carteirinha é a garantia dos direitos”.


A Piracicabana também foi procurada, mas não respondeu até o fechamento desta edição.


 


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