O perigo de ser mulher no Brasil

Números de feminicídios e estupros sobem no país; sozinho, endurecimento das leis não elimina problema

Por: Sheila Almeida & Do Estadão Conteúdo e da Redação &  -  17/09/19  -  19:55
Dados provam a necessidade de educar população, polícia e sistema judiciário
Dados provam a necessidade de educar população, polícia e sistema judiciário   Foto: Imagem ilustrativa/Alexsander Ferraz/AT

Os números de estupros e feminicídios cresceram no país. Foram 66.041 estupros consumados em 2018 em território nacional, um recorde que representa média de 7,5 casos por hora e supera em 4,5% os 63.157 registros de 2017. Já os feminicídios subiram 4,7%, indo de 1.151 em 2017 para 1.206 casos no ano passado – mesmo com queda de 10% nos homicídios no Brasil.


Os dados são do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019, que indica como é perigoso ser mulher no Brasil. Para essa realidade mudar, segundo especialistas em Segurança Pública e Direito, não bastam leis. É preciso educar população, polícia e sistema judiciário.


Segundo o estudo, o ápice da mortalidade feminina se dá aos 30 anos e o perigo não é por conta da violência do lado de fora. Em 88,8% dos casos, o autor do assassinato foi o companheiro ou ex-companheiro da vítima.


Isabela Sobral, pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública – órgão responsável pelo levantamento nacional – destaca outra estatística: mais da metade das vítimas de estupro são meninas menores de 13 anos. São quatro por hora. Por isso, segundo ela, não adianta só aumentar a pena ou mudar as leis. É preciso educar. 


“Em 2009, houve alteração da lei. Mas mesmo depois, o aumento segue. Foram 43.869 estupros no Brasil em 2011, por exemplo [já depois da mudança] e mais de 66 mil agora. Se em 2011 já valia o novo enquadramento, já não há porque culpar só a mudança na legislação”, diz ela, que não sabe dizer se as leis atuais garantem queda.


“A gente tem várias leis. É difícil dizer se funciona, porque sempre tem aumento de números. Será que está funcionando bem? Mas a gente não tem que esperar só delegacia. Prevenção começa com educação”.


Investimento


A presidente da Comissão da Mulher Advogada da Ordem dos Advogados do Brasil Subseção Santos (OAB-Santos), Flávia Santos, concorda, mas ressalta que seria preciso mais investimento.


Segundo ela, antes de funcionar 24 horas, a DDM Santos tinha 18 funcionários e agora está com 19. “Então, não adianta o governo inaugurar unidades de funcionamento estendido, sem pessoal. Quem está lá, não dá conta”.


Por outro lado, a advogada considera que não haverá avanço sem reeducação também de quem atua no tema diariamente. “A lei é benéfica. Mas nem sempre a aplicação é tão adequada quanto deveria”, diz, lembrando o caso de um motorista que estuprou uma moça embriagada e foi absolvido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) sob alegação de que a vítima, embriagada, assumira o risco do estupro.


Treinamento 


Para Ana Paula Borgomoni, presidente da Comissão de Direito de Família da OAB São Vicente e também presidente do Projeto de Prevenção e Enfrentamento de Violências contra Mulheres, Crianças e Adolescentes (Previmca), é preciso treinar a polícia.


“É preciso capacitação de muitos profissionais que, às vezes, até por conta do calor dos fatos, não consegue distinguir no Boletim de Ocorrência se é feminicídio ou não, se é estupro ou não. Meu sonho é que todas as vítimas de violência sejam acolhidas também por psicólogos nas DDMs”.


*O Previmca atende mediante chamado pelo Instagram (@Previmca), Facebook (/PREVIMCA) e WhatsApp (13) 99657-3457.


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