Muçulmanos da Baixada Santista encaram o Ramadã com restrições devido ao coronavírus

Hábitos de higiene e atos de caridade, que já faziam parte dos rituais do islã, se intensificam durante pandemia, mas jantares entre famílias estão vetados

Por: Nathalia Perez  -  24/04/20  -  21:10
Comunidade muçulmana na Baixada Santista conta com cerca de 30 mil pessoas
Comunidade muçulmana na Baixada Santista conta com cerca de 30 mil pessoas   Foto: Reprodução/Instagram

Começou nesta sexta-feira (24) o Ramadã, o nono e sagrado mês do calendário do islã. Composta por um número estimado de 30 mil pessoas, a comunidade muçulmana na Baixada Santista enfrentará os próximos 29 ou 30 dias com restrições em seus rituais devido à pandemia do novo coronavírus. Alguns hábitos característicos da religião e do mês, porém, se intensificarão com a crise epidemiológica.


No Ramadã, os muçulmanos praticam o jejum, da alvorada ao pôr do Sol, como uma forma de demonstrar devoção a Alá (como chamam Deus) e de purificar a alma e o corpo. É época, também, em que os atos de caridade, estimulados pela fé também em outros meses, são redobrados. 


Presidente da Sociedade Beneficente Islâmica do Litoral Paulista, o comerciante Salah Mohamad Ali destaca que, por conta do coronavírus, as orações coletivas e os tradicionais jantares entre famílias para o desjejum não ocorrerão neste Ramadã, seguindo as orientações sanitárias das autoridades municipais, governamentais, nacionais e mundiais a respeito de aglomerações.


"Fizemos um comunicado pedindo para ninguém frequentar a Mesquita Islâmica de Santos até que melhore a situação, até ter outra orientação dos governantes. Pedimos para que eles sigam o que diz a Organização Mundial da Saúde e fiquem em casa isolados, porque o bom muçulmano é aquele que não prejudica o outro", comenta Salah em contato com ATribuna.com.br.


Em nome da associação islâmica que contempla o litoral de São Paulo, ele recomenda que cada um faça a quebra do jejum após o Sol se por em suas casas, com suas famílias. "Essas festas em que juntamos seis, sete famílias estão proibidas este ano até segunda ordem dos governantes".


Os cuidados com a higiene pessoal têm sido salientados o tempo inteiro e apontados como essenciais por profissionais da saúde na prevenção à Covid-19, a doença causada pelo novo coronavírus, e no combate à proliferação do vírus. O presidente da associação islâmica lembra que a limpeza e a higiene estão nos fundamentos do islamismo e representam metade da religião.


Fazem parte da crença e dos costumes muçulmanos as cinco orações diárias com o fiel voltado em direção a Meca. Antes delas, que são chamadas de salat, há um ritual de lavagem do corpo, em que o religioso limpa com água as mãos, as narinas, os braços até a altura do cotovelo, o rosto, a cabeça, as orelhas e ouvidos e os pés. 


Às sextas-feiras, é realizado o Jumu'ah, uma oração complementar e específica daquele dia da semana, que é considerado sagrado pelos praticantes do islã. Muçulmanos vão à mesquita para orar juntos logo após o meio-dia. Salah diz que, segundo os preceitos da religião, em grupo, esta oração  traz mais benefícios ao fiel do que a individual. Só que, neste Ramadã, líderes religiosos estão orientando que os muçulmanos não se dirijam ao local de culto e o façam em suas residências, com suas famílias.


"A comunidade da Baixada Santista tem seguido isso. Não estão indo à mesquita para fazer as orações e nem para as aulas de árabe que lá oferecemos. O próprio profeta Muhammad [Maomé] já aconselhava, naquela época, para a pessoa que estava com a doença, para ficar isolada", recorda Salah.


Caridade e jejum


O que era uma prática para marcar o fim do jejum do Ramadã se tornará corriqueira ao longo do mês e enquanto houver necessidade por conta da pandemia. As cestas básicas montadas para famílias que precisam de mantimentos e instituições de caridade serão entregues pela comunidade islâmica da Baixada Santista em mais ocasiões, de acordo com o presidente da Sociedade Beneficente Islâmica do Litoral Paulista, já que, para eles, "a vida das pessoas é muito sagrada".


Já o ato de jejuar é mantido neste Ramadã atípico no mundo inteiro. Salah afirma que os muçulmanos acreditam que o jejum age como um remédio para praticamente 30 doenças, e, por isso, poderá ajudar a melhorar a imunidade, em vez de afetá-la diante do surto do novo coronavírus. Além disso, ele defende que a abstinência parcial de alimentos no dia ajuda a praticar a paciência durante uma situação de caos.


Pessoas que contraíram a Covid-19 ou estão lidando com outras doenças, viajantes e grávidas, porém, não precisam fazer o jejum neste período. Mulheres menstruadas não devem jejuar também, como relembra Salah. O ritual, no entanto, deve ser recompensado pelo muçulmano em um outro momento.


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