Jovem sequestrado na maternidade em 2001 reencontra pais e fala sobre futuro

'Minha vida começou de fato quando voltei para os meus pais', diz Filipe Francisco Lopes Dantas, hoje com 18 anos

Por: Eduardo Veloso Fuccia & Da Redação &  -  26/01/20  -  13:35
Filipe diz que sequestro é superado pela família e hoje ele sonha em ser professor
Filipe diz que sequestro é superado pela família e hoje ele sonha em ser professor   Foto: ( Carlos Nogueira)

Filipe Francisco Lopes Dantas protagonizou um caso que desafiou a Polícia Civil por cerca de três anos e mobilizou a sociedade, sempre na torcida por um final feliz. Atualmente com 18 anos, o jovem passa as férias em Santos, na casa dos pais.


Em fevereiro, com o começo do ano letivo, retorna ao Nordeste para cursar o 2º ano de Letras. Para conversar sobre o presente e os seus planos para o futuro, o universitário aceitou dar entrevista exclusiva para A Tribuna. Sobre o passado, considerado “página virada”, pouco falou, até porque não se lembra.


Filipe foi o bebê raptado da maternidade do Hospital Guilherme Álvaro, em Santos. Sob o pretexto de realizar o “teste do pezinho”, uma mulher vestida com um jaleco branco e segurando uma prancheta pegou a criança do colo da mãe. Ela sumiu com Filipe.


A investida da falsa enfermeira aconteceu em 20 de abril de 2001, quando o bebê tinha apenas três dias de vida. Condenada, a mulher cumpriu a pena e já está em liberdade.


A Polícia Civil localizou o menino na comunidade do Cachoeira, em Guarujá, em 20 de janeiro de 2004, após exatos dois anos, nove meses e três dias. Período gravado na mente de Filipe, ele equivale a “42 meses de gestação”, comparou a sua mãe, Francineide Batista Lopes Dantas, ao citar o tempo de angústia em seu diário.


Com a falsa enfermeira, o garoto residia em um barraco de madeira. A mulher se passava por mãe dele e de outras crianças, que também não eram os seus filhos biológicos.


Vida que segue, Filipe virou adulto. Completou a maioridade em 17 de abril de 2019 e celebra a independência que vai conquistando, passo a passo, com estudo e trabalho.


O que o motivou a escolher o curso de Letras?

A inspiração veio em uma aula de Literatura, no 1º ano do Ensino Médio. Mas o que me inspirou não foi apenas a matéria, que era a minha favorita na época, mas principalmente a empolgação do professor Adriano. A partir daí, tomei a decisão: vou ser professor!


Você estuda na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), no campus de Cajazeiras (distante a 485 quilômetros da capital João Pessoa). Por que uma faculdade na Paraíba, tão longe dos pais, que moram em Santos?


A maior parte de minha família mora lá, onde costumava passar as minhas férias escolares. Meus avós maternos, com quem moro atualmente, são de São João do Rio do Peixe. O avô paterno é de Poço de José de Moura.


E a sua casa fica perto da faculdade?


Demora cerca de uma hora para chegar. Vou de ônibus, que é fornecido pela prefeitura para o transporte de estudantes. Não é tão longe, mas tem as paradas.


Estudar em uma universidade federal é o sonho de muitos jovens? Como foi o seu preparo para o vestibular?


Consegui entrar na UFCG graças à nota que obtive no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Ela foi lançada no Sisu (Sistema de Seleção Unificada) e fui aprovado em primeiro lugar no curso de Letras-Português, escolhido como minha primeira opção.


Qual foi a sua segunda opção?


Letras-Inglês.


A sua meta profissional é atuar como professor. O que acha mais atrativo na carreira?


A questão é até filosófica. O ser humano precisa crescer cuidando de outros seres humanos. Nessa interação, o que se destaca é que também aprende quem ensina.


A sua dedicação à faculdade é integral ou dá tempo para trabalhar?


Estudo pela manhã. No segundo semestre de 2019, quando estava no 1º ano, comecei a dar aulas de reforço a alunos dos 6º, 7º, 8º e 9º anos do Ensino Fundamental II. As aulas faziam parte de um projeto da Escola Estadual José Américo de Almeida, em São João do Rio do Peixe. Espero a renovação do projeto neste ano.


Quais os seus planos após se formar?


Nunca tive essa ideia fixa na cabeça. Porém, após passar 11 meses fora de casa no ano passado, percebi o quanto gosto de Santos e que não consigo ficar longe dos meus pais. Então, pretendo retornar à cidade depois de me formar e exercer a profissão por aqui.


A cidade onde mora com os avós fica no sertão paraibano. Conseguiu se adaptar nela?


Sempre fui muito caseiro, então a adaptação fica mais fácil. Mas existe um grande contraste entre uma pequena cidade do sertão e outra do litoral, como Santos.


Qual o seu lazer lá?


Gosto de ir a bares, restaurantes.


A qualidade da convivência com os seus pais compensou a lacuna causada pelo tempo em que ficou distante deles por causa do rapto na maternidade?


Da minha parte sim, porque sou muito apegado a eles, principalmente, à minha mãe. Além disso, não tenho memória alguma daquele período. Era muito pequeno e a minha vida começou de fato quando voltei para os meus pais. Mas essa lacuna de tempo é algo que nunca será compensado para eles.


Esse assunto em família é proibido, superado ou evitado?


Superado. Mas quando eventualmente tocado, agora, vira até motivo de piada.


Por exemplo...


Piada do tipo “já sumiu uma vez, não vai sumir de novo”.


A Tribuna não esquece


21 de abril de 2001.A primeira reportagem do caso, com a imagem dos pais, Francineide Batista Lopes e Francisco Fernandes Dantas, e um retrato-falado da sequestradora. O menino, recém-nascido foi levado da maternidade do Hospital Guilherme Álvaro, entre 12h e 12h30, do dia anterior. Uma mulher se apresentou como enfermeira e levou o bebê para supostamente fazer um exame de raios-X. O menino foi localizado em 2004, na comunidade do Cachoeira, em Guarujá.


Logo A Tribuna
Newsletter