Se você tem saldo no FGTS e não viu o seu extrato recentemente, é bom dar uma olhada. O valor do saque emergencial, de até R$ 1.045,00, liberado pelo Governo Federal, pode ter ido para as mãos de bandidos. Os casos vêm aumentando em todo o Brasil e não é diferente na região: golpistas fraudam o aplicativo Caixa Tem, da Caixa Econômica Federal, mudam os dados do beneficiário e ficam com o dinheiro.
A Caixa abriu automaticamente conta poupança social digital para os trabalhadores e depositou lá os valores para todos que têm saldo no FGTS, seguindo um calendário que é de acordo com o mês de aniversário. Ou seja, mesmo quem não quer retirar, teve o valor depositado. Se após um mês não for sacado ou usado para pagamento de contas e boletos, o total volta ao FGTS.
Mas nesse meio tempo, os criminosos podem agir. A movimentação do dinheiro só pode ser feita pelo Caixa Tem e o aplicativo tem sido invadido. Muitas pessoas quando tentaram entrar para verificar o valor, não tiveram acesso porque suas informações pessoais, como e-mail e telefone, foram alteradas. A única saída é ir até uma agência do banco.
Foi o que aconteceu com o trabalhador portuário João Carlos José dos Santos, de 50 anos, que mora em Santos. “Na Caixa falaram que fizeram dois saques na minha conta, de R$ 500,00 e de R$ 400,00 e pouco. O e-mail cadastrado não era meu e o nome de quem sacou era Luís Carlos. Aí entrei com documentação para contestar, me prometeram resposta por e-mail ou mensagem de texto. Faz mais de 10 dias e estou esperando ainda”.
Para ele, isso demonstra a falta de segurança do banco. “Como pode outra pessoa ter acesso aos meus dados? Para a gente tentar alguma coisa na Caixa é uma burocracia, mas essas pessoas conseguem sacar o FGTS dos outros?”, questiona.
Também moradora de Santos, a assistente administrativa Irene Silva Aguiar, de 35 anos, teve o valor retirado por bandidos. Contestou, mas a Caixa negou a devolução do dinheiro. Ela fez boletim de ocorrência, entrou com pedido de reconsideração no banco e aguarda um posicionamento.
“Na delegacia disseram que são muitos casos do tipo. Com o meu dinheiro, os golpistas pagaram boletos. Pedi para a Caixa um comprovante da contestação e não me deram. Se não for ressarcida vou entrar na Justiça”.
"Assim que vi que haviam sacado o meu dinheiro fiz a contestação na Caixa Econômica Federal. O saque foi feito em nome de 'Davi Ferreira', uma pessoa que nunca ouvi falar. É obrigação da Caixa tomar alguma atitude e devolver o meu dinheiro", completa o publicitário Carlos Vinícius Lopes.
Direitos
Coordenador do Procon de Santos, o advogado Rafael Quarema afirma que o banco tem responsabilidade, com base na teoria do risco do negócio. “O banco que se predispõe a oferecer esse serviço, disponibiliza o aplicativo, deve arcar com o ônus também, não pode ter só o bônus. Portanto, deve absorver o prejuízo e ressarcir o consumidor em hipótese de fraude”.
Quaresma orienta que as pessoas prejudicadas registrem a reclamação no Procon da sua cidade ou na plataforma da Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça (www.consumidor.gov.br). “E depois da tentativa de se resolver administrativamente, se não conseguir, o consumidor pode procurar a Justiça”.
O advogado Brunno Brandi ressalta a obrigação do banco de ressarcir os clientes nesse caso. Caso isso não ocorra, ele afirma que o consumidor deve procurar a Justiça para ter o dinheiro ressarcido e o prejuízo moral reparado.
“A Caixa é a única instituição financeira do País que tem competência pela guarda do dinheiro do FGTS do trabalhador. Não é nenhum exagero dizer que ela tem obrigação social, legal e moral de preservar esse capital”, diz Brandi.
Para o advogado, cabe à Caixa agir de todas as formas e dedicar os seus melhores esforços para prevenir a ocorrência de fraudes capazes de prejudicar os clientes. “Nessas horas de extrema necessidade, receber a notícia de que o banco ao qual você foi obrigado a confiar o seu dinheiro, por falta de zelo, cautela, o entregou a bandidos, não irá passar despercebido pelo Poder Judiciário”.
O banco
Em nota, a Caixa afirma que, para conter as ações dos fraudadores, diversos mecanismos têm sido implementados pelo banco e que melhora os critérios de segurança de acesso ao Caixa Tem constantemente.
O banco informa que pedidos de contestações de saque podem ser solicitados a qualquer momento nas agências, portando CPF e documento de identificação, e que os processos são analisados com a máxima rapidez. “Os resultados das análises são repassados diretamente aos interessados. No caso de negativa do pedido, poderá ser solicitada a reanálise".
A Caixa não quis informar o número de fraudes do tipo registradas. “Por motivos de segurança, os dados de contestações e os critérios técnicos de análise de suspeitas de fraudes não podem ser expostos ao público, mas apenas aos órgãos policiais envolvidos nas investigações”.
O banco afirma atuar com a Polícia Federal e demais órgãos de segurança pública na identificação de casos suspeitos e na prevenção das fraudes.
Polícia Federal
A Polícia Federal (PF) informa que, por se tratar de investigações em andamento, não há dados consolidados para serem divulgados. A PF diz que não há a necessidade de o cliente registrar boletim de ocorrência.
“A Caixa encaminha para a Polícia Federal dados estruturados de todos os processos onde houver irregularidades. Esses dados são alocados em uma base e são utilizadas ferramentas para a identificação da atuação de organizações criminosas e fraudes”.