Dono de construtora de Santos é processado por vender apartamentos fantasmas: 'Verdadeira arapuca'

Responsável pela Criar Construção Civil foi denunciado por estelionato; empresa vendeu apartamentos na cidade, mas nunca construiu

Por: Maurício Martins  -  18/01/21  -  10:26
Terreno onde a Criar Construção levantaria um empreendimento
Terreno onde a Criar Construção levantaria um empreendimento   Foto: Vanessa Rodrigues

Com poucas esperanças de conseguir de volta o dinheiroinvestido emum imóvel jamais construído,pessoas que pagaram valores para a Criar Construção Civil, de Santos,querem agora a condenação doentãoproprietário da empresa, Ronald dos Anjos Castro, por estelionato. Castrofoi denunciado pelo Ministério Público Estadual (MPE), mas ainda não há sentença na ação criminal que está andamento.


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A situação foi mostrada em quatro reportagens de A Tribuna, em 2015 e 2016. Mais de 10 anos depoisda venda dos apartamentos que não saíram do papel, os compradores não conseguiram reaver os valores, mesmo após ações judiciais na área civil. Segundo eles, não há mais bens em nome da Criar ou de seu proprietário.


O terrenonaRua Teixeira de Freitas, 35/37, no Campo Grande,é a lembrançadessahistória sem final feliz.Ali deveria ser erguido, até 2014,oprometido residencialCasillerodo Campo. A construtora arrecadou milhares de reais vendendo os imóveis na planta com condições atrativas.


Além de Ronald, mais quatro são réus na Justiça Criminal. Aex-mulher dele, aentãoengenheira daconstrutora e osócio de umaempresaque ficou com o terrenoda Teixeira de Freitas, alegandoque Ronald tinha uma dívida deR$ 2 milhõescom ele.Segundo a denúncia, essa transação teria sidouma simulação(os dois estariam combinados), para desvincular o terreno daCriare não dar condições para que a Justiça bloqueasse o terreno.


“Os 4 réus de mais de 30 estelionatos causaram muita destruição financeira, de saúde e moral a dezenas de famílias. Apesar dos diversos processos cíveis com sentenças favoráveis às vítimas, ninguém consegue executar a sentença e recuperar algum dinheiro”, diz oadministrador Dario Diegues Spinelli, de 39 anos.


Spinellidiz queficou, na época, sem os R$ 135 mil que economizou para a casa própria.“Os réus fazem ocultação patrimonial através de familiares e empresas de terceiros. Contamos com a justiça criminal para a punição desses roubos milionários”, afirmaele, quecriouum instituto (www.facebook.com/institutopelasegurancaimobiliaria) para alertar pessoas sobre golpes.


O despachante aduaneiroWalter Herrera Júnior, de 62 anos,afirma que desembolsou R$ 80 mil no negócio. “Foi uma verdadeira arapuca”, diz. “Pior é que a gente luta contra o cara (Ronald) e contra a Justiça. As custas são altas e estamos fazendo um esforço muito grande para continuar o processo.O honesto tem a maior dificuldade”.


A bancária Karina Elizabeth, de 41 anosressalta quepagou R$ 90 milà Criar como entrada de um dos apartamentos.“Me sinto impotente. Comprovamos a maracutaia toda a acham que ainda faltam elementos”, pontua. Segunda ela, há muita dificuldade para a Justiça notificar os acusadose os processos demoram.


OengenheiroAlbertoCaldeiraexplica querepassou R$ 100 mil à Criar para ter a casa própria. “É muito complicado. Temosações na Justiça, começa na cível,que é difícil citar os réus e ficamos andando em círculos. Esperamos que no processo criminal eles paguem pelo crime, porque as coisas parecem que vão contra nós, que já tivemos prejuízos. É triste”,


O aposentadoDomingos Mantovani,62 anos,diz queentregou R$ 99 mil à construtora em 2011.“Estou desanimado e inconformado com a Justiça, que, no mínimo, deveria proibi-lo de construir e continuar enganando os outros.Tenho pouca esperança, acreditomais na Justiça Divina”.


Advogado de empresário afirma que não houve crime


O empresárioRonald dos Anjos Castro não falou com a Reportagem e se manifestou por meio de seu advogado, o criminalista Danilo Pereira.Pornota, o defensor disse que aCriar Construção Civil era a legítima proprietária do terreno do empreendimento.


“Matinha corpo técnico e funcionários e toda a documentação necessária para a obra, inclusive mediante processo juntoàSecretaria de Obras, através doengenheiro responsável. Realizouprojetosondagem eperfilgeológico doterreno,planta defundação,projetoarquitetônico,projetotécnico desegurança contraincêndio, que lhe permitiam o início das obras, cumprindo todas as exigências da Municipalidade, inclusive com aprovação doprojeto eincorporaçãoimobiliária”.


Segundo o advogado, são práticas regulares que demandam alto custo de investimento.Diz ainda, queCastroobteve financiamento da obra através do Banco BVA, cujos contratos previam expressamente. Mas,ocrédito não pode ser levantado em razão da intervenção e posterior liquidação da instituição financeira, o que inviabilizou o cronograma de obras.


“A Criar Construção Civil Ltda., através de seu titular Ronald dos Anjos Castro, tentou de todas as formas resolver as questões financeiras advindas após a liquidação do Banco BVA. Houve distrato e proposta de acordo para todos os adquirentes, ao qual restaram infrutíferas posto que alguns buscaram nas páginas policiais a devolução dos valores”.


Segundo Pereira,a situaçãoinviabilizou totalmente a obtenção de crédito pela empresa e afastou construtoras interessadas em negociar e continuar a obra.Ele afirma queé evidente queCastroreconhece o prejuízo aos adquirentes, masafirma que elefoi também prejudicado em razão da liquidação dobanco financiador“e a perseverança em manter a empresa nas páginas policiais, afastando investidores, e a inevitável quebra”.


Por fim, ressalta que umaaçãocivilpública proposta confirmou inexistir qualquer prática de ilícito por parte da Criar, reconhecendo o fato como risco do negócio a ser resolvido na esfera cível. “Ronald dos Anjos Castro vem esclarecendo pormenorizadamente todos estes fatos e outros mais, e sua defesa é lastreada em robusta prova documental e testemunhal", finaliza o advogado.


Terreno com problemas


A Tribuna acompanha o caso desde fevereiro de 2015 e já havia publicado quatro matérias sobre o assunto. O terreno da Rua Teixeira de Freitas começou a chamar a atenção da Reportagem no início de 2015, por causa do estado de abandono, água acumulada e problemas para os vizinhos.


A partir daí, foi feita uma ampla apuração sobre a situação do imóvel até chegar no projeto vendido e não entregue pela Criar Construção Civil. A Tribuna descobriu que mais de 30 pessoas haviam comprado o imóvel na planta, depositando suas economias em um sonho.


A Reportagem foi até a sede da Criar na Ponta da Praia e não encontrou ninguém. Localizado, o dono da empresa, Ronald dos Anjos Castro, disse que teve problemas com um empréstimo bancário e não conseguiu concluir a obra. Prometeu fazer acordos para devolver valores.


Um ano depois, a Reportagem voltou ao assunto mostrando que ele não cumpriu a promessa. Logo depois, Polícia Civil e Ministério Público Estadual (MPE) iniciaram investigações que acabaram com a denúncia do empresário por estelionato, acusado de ter praticado um golpe.


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