Deslizamentos não podem ser evitados, mas tragédias sim, dizem especialistas

Ocupação irregular é um problema justamente por mexer com a estabilidade do local; autoridades precisam ficar atentas às alterações nos morros

Por: Arminda Augusto & Nathália de Alcantara &  -  06/03/20  -  09:13
Deslizamentos não podem ser evitados, mas tragédias sim
Deslizamentos não podem ser evitados, mas tragédias sim   Foto: Carlos Nogueira/ AT

Diversos fatores são responsáveis pela tragédia que a Baixada Santista viveu no início da semana. Desastres com deslizamentos de terra acontecem sempre por mais de um motivo, explicam especialistas ouvidos por ATribuna.com.br.


Segundo o arquiteto urbanista Denis Cossia, formado pela Universidade de São Paulo (USP) e pesquisador pelo laboratório Quapá, a ocupação irregular de áreas de preservação ambiental é uma das causas dessas tragédias.


>>> Veja como ocorrem os deslizamentos


“Quando acontecem desastres desse porte, nunca é por um só fator. O primeiro agravante tem a ver com invasões ou loteamentos irregulares. Isso fragiliza o solo e facilita o deslizamento, pois removem a vegetação”.


O especialista explica, no entanto, que acontecer um deslizamento é algo comum. “É natural que isso aconteça, tendo ou não um culpado. As pessoas moram nesses lugares por falta de opção, por serem empurradas para as margens”.


O detalhe, segundo Denis, é que ocupar morros gera instabilidades. “Morar em lugar com inclinação acima de 20 graus é pedir para que algo ruim aconteça. As pessoas querem planificar, cortam o solo, mexem na estrutura. É algo contra a força da natureza, e ela cobra a sua parte”.


A situação fica ainda pior quando chove. O arquiteto urbanista explica que ela precisa escorrer e nada será capaz de segurá-la. “É preciso ter políticas de segurança para a comunidade e uma rede eficiente de monitoramento do solo para saber se ele está estabilizado”.


Despreparo


Segundo a geóloga Cassandra Maroni Nunes, que foi coordenadora da Regional dos Morros da Prefeitura de Santos, a surpresa é “o quão despreparadas as pessoas estão”.


“Do ponto de vista da autoproteção da população, as pessoas se sentem muito sós. Muitas não têm para onde ir. Alguns lugares abrem gentilmente suas portas, mas isso não pode ser assim. É preciso que haja uma maior organização para eventos dessa natureza”.


Ela enfatiza que a tragédia acontece pela situação que se tem. “Se o escorregamento no meio do mato acontece e não tem nada do lado ou abaixo, tudo bem. Mas aconteceu um deslizamento e tem moradias por perto. Nós temos, hoje, um grau de ocupação das encostas bastante elevado, com pouco controle”.


Para a especialista no assunto, a coisa mais difícil que existe quando não há uma política pública habitacional é controlar ocupação nas encostas, porque são elas que restam para as pessoas ocuparem. "Ninguém se instala nesses lugares porque gosta ou porque quer. É porque não tem opção".


Cassandra explica, ainda, que foi tanta água que pode ser que algum trecho de solo se rompa, mesmo aqueles que não foram mapeados, o que seria uma situação de alerta máximo.


"Há um nível de saturação do solo bastante elevado por conta da alta pluviosidade. É preciso refazer esse mapeamento a cada ciclo chuvoso, porque isso muda muito e modifica a configuração da encosta. Havendo isso muito bem mapeado, dá para trabalhar com o risco e estabelecer ações preventivas".


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