(Des)conectados: Isolamento vira teste de paciência para jovens

Pandemia exige dos dos adolescentes mais tempo em frente às telas

Por: Tatiane Calixto & Da Redação &  -  21/02/21  -  22:56
Fechamento das escolas e a adoção das aulas on-line atingiu em cheio os adolescentes
Fechamento das escolas e a adoção das aulas on-line atingiu em cheio os adolescentes   Foto: Fausto Sandoval/Unsplash

Pedro Muller tem 17 anos. Nasceu em 2004, na mesma época em que a maior rede social do mundo, o Facebook, foi lançada. Faz parte de uma geração hiperconectada e, como qualquer adolescente, gosta de estar no meio da turma. Mas, apesar dos grupos no WhatsApp, ele, seus amigos e milhões de jovens mundo afora sabem, lembraram ou aprenderam que a relação olho no olho não pode ser substituída. Na pandemia, todos vivem a angústia de terem que se distanciar da galera em nome da saúde.


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O jovem mora no Embaré e está no 3º ano do Ensino Médio. Conta que, na pandemia, a avó o presenteou com um videogame. Mesmo com tempo sobrando para zerar os jogos preferidos, Pedro sentiu o impacto do isolamento - e olha que ele se considera um cara tranquilo. “Ficar todo o tempo em casa é o pior”.


>>Leia a primeira reportagem da série A Pandemia sob o Olhar das Crianças e dos Jovens


Se Pedro Muller sentiu, foi ainda pior para Gabriel Andrade, 14 anos, morador do Boqueirão e estudante do 9º ano. Gabriel conta que quando foi decretada a pandemia e se exigiu o distanciamento social, se ver sem as responsabilidades do dia a dia até que não pareceu algo tão ruim. Porém, o tempo mostrou que não era bem assim.


“Eu saía bastante. Quando chegaram as férias e vi que não poderia sair com meus amigos, foi muito ruim. Eu queria ver os amigos pessoalmente”.Os papos pelo videogame ou WhatsApp acabaram cansando.


Julia Bucheb Turato, 16 anos, mora no Aparecida e está no 2º ano do Ensino Médio. Ela também saía bastante com os amigos e reclama do tempo em casa. Tanto que a mãe da adolescente teve que encontrar uma forma de minimizar a sensação de isolamento.


“No meio da pandemia, minha mãe ficou preocupada porque eu só ficava na frente do computador e não estava legal. Então, ela conversou com a mãe de uma outra amiga que também não estava bem e, com todos os cuidados, nos vimos pessoalmente”. E isso, conforme Julia, foi um combustível importante para se animar e continuar a caminhada.


Escola


Outro fator que atingiu em cheio os adolescentes, contribuindo para o distanciamento da turma, foi o fechamento das escolas e a adoção das aulas on-line. Mudar a forma de aprender exigiu adaptação mesmo a eles, que têm facilidade com os meios digitais. E mais: o aprendizado que acontece com a socialização também foi prejudicado.


“Eu entrei no Ensino Médio, numa turma nova, e veio a pandemia. Eu não consegui aprender muito e passar o tempo todo no computador foi difícil”, confessa Flora de Sá Domingos Dias, de 15 anos, da Ponta da Praia.


A situação foi tão exaustiva que, para ela, o melhor da pandemia foi entrar de férias e dar uma pausa nas horas em frente a uma tela tentando se adaptar à forma de ensino e, de fato, aprender. Flora também negociou um encontro com poucos amigos para amenizar a saudade. “O melhor rolê foi ir a uma praça, com distanciamento e tudo, jogar uma partida de Uno”.


Julia Hibrain Rocha, de 15 anos, do Aparecida, relata essa angústia de ficar isolada e do aprendizado on-line. “No começo da pandemia achei que ia dar tudo certo. Mas comecei a ficar muito mal. No meio, eu não estava conseguindo aprender mais nada e até chamaram minha mãe”.


Desafio


Por mais dificuldades que os jovens tenham encontrado no ensino remoto, eles mesmos sabem que a solução diante da pandemia não é simples.


“Tem que ver como será o retorno. Voltar uma vez na semana é perda de tempo. Você vai um dia, chega lá e são tantas limitações que isso só aumenta o risco. Fora o trabalho dobrado dos professores com alunos no presencial e remoto”, opina Gabriel.


Flora concorda e chama atenção para as condições estruturais de muitas escolas. “Falam de ventilação, mas sei de classes em que a janela é emperrada, não abre”.


Uma chance para o autoconhecimento


Apesar das dificuldades, eles também aprenderam nesta pandemia a se dedicar a atividades diferentes, como ajudar nas tarefas domésticas ou aprender novas receitas na cozinha. Pedro Schneider, 15 anos, morador do Aparecida e estudante do 2º ano do Ensino Médio, conta que também se preocupou com a escola no começo. Até porque ele planejava uma vaga de jovem aprendiz em 2020.


Esse desespero inicial representou o pior momento da pandemia, na opinião do estudante, mas também desencadeou o melhor que aconteceu até agora. “Por eu ter me estressado tanto, aprendi a me organizar e encontrei maneiras de aprender mais. Eu acabei me conhecendo melhor”.


Ainda que possa parecer que permanecem no olho do furacão, principalmente agora com a retomada parcial das aulas, os adolescentes já começam a pensar no mundo pós-pandemia. Provocada sobre o futuro pelo educador do projeto Juventudes, Maurício Marin Eidelman, a maioria é otimista e fala em empatia, vacina e uma nova consciência.


Mudança


“Para mim, o pior momento da pandemia foi saber das mortes. As pessoas morrendo por falta de oxigênio”, conta Leonardo Machado Brito, 14 anos, estudante do 9º ano e morador do Embaré. Por tudo isso, no futuro pós-pandemia de Leonardo, os estudantes vão conseguir retomar suas rotinas de estudo e todas as mortes não terão sido em vão.


“A gente vai aprender e mudar com tudo isso. Acho que vai servir para a gente se cuidar mais. Quem sabe ter uma gripe e usar máscara?”


O projeto


Esta reportagem é fruto do segundo encontro virtual do projeto "A Pandemia sob o Olhar das Crianças e dos Jovens", uma parceria entre A Tribuna e Sesc Santos. O objetivo é extrair desse público mais novo como tem sido a experiência de viver a pandemia, suas mudanças, restrições e desafios. O segundo encontro foi realizado na terça-feira (16), com adolescentes inscritos no projeto Juventudes, de 14 a 17 anos. O educador do projeto, Maurício Marin Eidelman, e a fonoaudióloga Simone Oliveira, convidada a integrar a equipe, participaram com perguntas e provocações. O próximo encontro será com jovens de 17 a 19 anos e o projeto encerrará com uma abordagem mais ampla, com análise de resultados pelos profissionais envolvidos na escuta.


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