Arroz e feijão indigestos: Preço da cesta básica sobe muito além da inflação

Com altas acima de 20%, preços puxam o valor médio da cesta básica para cima e não há muito o que o consumidor possa fazer

Por: Da Redação  -  09/09/20  -  09:28
Preço do grão para o consumidor disparou 71% desde o início da pandemia
Preço do grão para o consumidor disparou 71% desde o início da pandemia   Foto: Carlos Nogueira/AT

Não há espaço para “patriotismo” nas relações de consumo, mesmo que se trate de comida. Dólar em alta, aumento nas exportações de alimentos e mais consumo, motivado pela maior frequência de refeições em casa e pelo pagamento do auxílio emergencial, fazem o preço da cesta básica subir muito além da inflação. Ao Governo, resta regular seus estoques. E, ao consumidor, há pouco a ser feito quando o aumento é estrutural, embora o Procon atue contra o chamado aumento abusivo (leia abaixo).


O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial de inflação, está acumulado em 0,46% entre janeiro e julho deste ano. No mesmo período, segundo a Associação Paulista de Supermercados (Apas), o feijão subiu 23,1%, e o arroz, 21,1%.


“Estou pedindo um sacrifício, patriotismo para os grandes donos de supermercados para manter (os preços da cesta básica) na menor margem de lucro”, disse o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), na sexta-feira, em visita a Registro, no Vale do Ribeira.


Repasses, apenas


Um dia antes, a Apas emitiu nota, afirmando que “tem reforçado, desde o início da pandemia, para que os supermercados associados não aumentem suas margens de lucro e repassem aos consumidores apenas o aumento proveniente dos fornecedores”.


A instituição também propôs que os mercados “ofereçam aos seus consumidores opções de substituição aos produtos mais impactados por esses aumentos provenientes dos fornecedores de alimentos”.


O economista Fernando Wagner Chagas avalia que “a queda dos preços dos alimentos só será possível com o aumento da produção de alimentos da cesta básica ou a queda do consumo das pessoas, por causa da impossibilidade de comprar tais produtos ou pela substituição por similares”.
“De qualquer maneira, o presidente da República não conseguirá diminuir os preços dos alimentos pedindo patriotismo dos varejistas, porque o aumento da alimentação ocorre nas fábricas, que o repassam a toda a cadeia de consumo”.


Exemplo de fora


Um fator que leva os preços dos itens da cesta básica às alturas consiste nas exportações crescentes para a China, que, segundo Fernando Chagas, “está fazendo estoque para uma emergência no futuro”.
Exportar mercadorias é atrativo para o setor agropecuário devido ao “patamar elevado de R$ 5,00” (estava em R$ 5,365 às 12 horas de ontem), mas prejudica o consumidor porque, quando a indústria alimentícia precisa importar itens com maior demanda, gastam em dólar e repassam custos aos supermercados.


“O Governo, se quiser resolver a disparada dos preços dos alimentos, principalmente da cesta básica, precisará fazer um melhor planejamento do estoque regulador no País, como a China está fazendo neste momento”, considera o economista.


Os estoques públicos servem para o Governo intervir no mercado, tanto para garantir patamares de preço e renda para produtores quanto para regular o abastecimento interno, com a venda de alimento estocado nos períodos entre as safras para aliviar preços.


Conforme a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), há 20.834 toneladas de arroz e nada de feijão nos estoques públicos. Os dados podem ser vistos no site (clique aqui).


Procon atua contra aumento abusivo


O coordenador do Procon Santos, Rafael Quaresma, afirma que o órgão atua contra o aumento abusivo de preços, prática previsto repelida pelo Código de Defesa do Consumidor. “O inciso 10 do artigo 39 fala em ‘elevar sem justa causa o preço de produtos e serviços”, explica Quaresma.


Em um ambiente comercial em que não há congelamentos ou tabelamentos de preços, essa proteção ao consumo visa disciplinar a livre concorrência, não tolhe-lá. Ele dá como exemplo o comerciante que comprava um determinado produto por R$ 3,00 no início da pandemia, vendia-o por R$ 5,00, e, de repente, passa a vendê-lo por R$ 10,00, sem nada que justifique esse aumento.


“Perceba que a lei não fala em percentual abusivo. O que vai caracterizar (o abuso) é a falta de justa causa, ou seja, motivação”, esclarece.


Verificação


A atuação do Procon se dá justamente nesse aspecto, com o Código de Defesa embaixo do braço. Quaresma explica que os fiscais verificam notas fiscais de compra e venda dos produtos, para constatar algum eventual aumento sem justificativa, portanto, abusivo.


“Agora, um cenário com que a gente se deparou bastante na pandemia foi o comerciante que comprava o produto X por R$ 3,00, vendia a R$ 5,00 e, de repente, passou a pagar R$ 6,00 e vender a R$ 10,00. Nesse caso, há variação do distribuidor, do produtor, enfim, dos outros elos do ciclo produtivo”.


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